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TENDÊNCIAS/DEBATES
O atual cenário indica uma crise no setor energético?
SIM
Eficiência e racionalização x racionamento
LUIZ PINGUELLI ROSA
A CRISE não é iminente, mas é
preciso tomar medidas imediatas para que ela não ocorra.
O nível médio dos reservatórios das
hidrelétricas está acima do atingido
em 2001 no Sudeste e Centro-Oeste.
Na época, faltava usina térmica; hoje,
falta gás. Há cerca de um ano, a Petrobras informou que várias termelétricas não tinham contratos de compra
de gás e a Aneel as retirou do plano de
operação, subtraindo mais de 3.000
MW. Isso revelou um problema que
voltou à tona com a questão do gás natural em novembro de 2007. Nessa
ocasião, a Coppe-UFRJ enviou um
relatório ao ministro de Minas e
Energia, alertando para o agravamento da situação da geração elétrica que
está ocorrendo agora.
A antecipação da operação das termelétricas visa poupar água para o futuro e sinaliza as incertezas no setor.
Há atrasos nas obras, sobretudo de
hidrelétricas e do Proinfa, programa
pelo qual a Eletrobrás, em 2003-2004
viabilizou a construção de 3.300 MW
de usinas eólicas -menos de 50%
saiu do papel-, de pequenas usinas
hidrelétricas e de biomassa.
Há também o aumento do consumo devido ao crescimento econômico
e a uma melhora na distribuição de
renda, o que é positivo.
Por outro lado, os consumidores livres, grandes empresas, compraram
energia barata da rede de forma desregulamentada, dificultando o planejamento. Estes representam mais de
25% do consumo de energia elétrica
do país. É preciso estabelecer regras
para dar transparência na comercialização de energia.
Não há como projetar, licenciar e
construir novas usinas em menos de
três anos. A usina de Santo Antônio,
no rio Madeira, só operará em 2012; é
positiva a participação de Furnas,
mas deveria ser majoritária. Deve-se
dar à Eletrobrás, como o maior grupo
do setor, o papel de puxar os investimentos, como fez a Petrobras para a
auto-suficiência no petróleo. As empresas do grupo Eletrobrás se tornaram alvos de partidos aliados barganhando apoio em troca de cargos.
A esses aspectos do mundo físico
somam-se questões conceituais do
planejamento. Um claro sinal de que
há problemas no horizonte é a elevação do custo do mercado "spot", que
subiu de R$ 18/MWh em 2004 para
mais de R$ 500/MWh hoje. Furnas
terá um prejuízo de cerca de R$ 200
milhões mensais para comprar energia cara no mercado e vendê-la a preços muito menores para cumprir contratos que deveriam ser cancelados,
derivados da importação de uma
energia inexistente da Argentina,
contratada antes de 2003.
Com a operação das termelétricas,
inclusive a diesel, muito caro, a tarifa
logo subirá para os consumidores cativos da rede, que já pagam muito pela
energia elétrica, com exceção da tarifa social destinada à população de baixa renda. A tarifa no Brasil é maior do
que em muitos países desenvolvidos,
como Alemanha, Dinamarca, EUA,
França e Canadá. O gás natural liquefeito importado para aliviar a crise
também será caro.
Além de acelerar as obras no setor
elétrico e estimular as fontes alternativas de energia de rápida instalação a
custos compatíveis, como o bagaço de
cana, deve-se aplicar um plano nacional de eficiência energética. Trata-se
de implantar um sistema planejado
de estímulo à redução de perdas na
geração, transmissão, distribuição e
no consumo da energia elétrica, bem
como à redução do desperdício.
Melhorar a eficiência na transformação e nos usos da energia é a maneira mais barata e rápida de aumentar a disponibilidade de energia. Tem
a vantagem de gerar empregos diversificados e difundir a tecnologia mais
moderna em vários setores, além de
contribuir para evitar a emissão de
gases de efeito estufa. Poderia ser
conjugada com uma política industrial incentivando a produção de
equipamentos mais eficientes. A Eletrobrás tem experiência em incentivar a eficiência no consumo de energia através do Procel. Essas medidas
não têm contra indicação e podem ter
efeito no curto prazo.
LUIZ PINGUELLI ROSA, 65, físico, é diretor da Coppe-UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em
Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro) e
secretário do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas.
Foi presidente da Eletrobrás (2003-04). É autor do livro
"Tecnociências e Humanidades".
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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