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Lei contra lei
CHEGA A TER aspectos irônicos a discussão criada em
torno do voto nos presídios, objeto de recente resolução
do Tribunal Superior Eleitoral.
Com razões de sobra, juízes e
membros do Ministério Público
manifestam preocupação diante
das dificuldades inerentes à ideia
de assegurar-se o direito de voto
aos presos provisórios, no pleito
de outubro. A prerrogativa é garantida constitucionalmente aos
152 mil brasileiros que, hoje,
aguardam julgamento nas prisões; o TSE simplesmente seguiu
o disposto na Carta.
Seguir o que determina a lei
não é, contudo, tarefa simples
nem hábito arraigado entre as
autoridades no que tange à realidade do sistema prisional. Basta
dizer que a Lei das Execuções
Penais determina que cada preso
tem direito a cela individual, de
no mínimo 6 m2, com aparelho
sanitário e lavatório (art. 88), ou
que lhe está assegurada a possibilidade de exercer trabalho remunerado na prisão (art. 41).
Longe de constituir privilégio,
determinações como estas representam um fator a mais de
segurança para a sociedade
-que em nada se beneficia ao
ver detentos amontoados em covis, cuja administração na prática está frequentemente a cargo
de facções do crime organizado,
onde se trafica, mata, tortura e
estupra impunemente.
Mas é irrealista imaginar, por
exemplo, que mesários (seriam
4.000 a requisitar) possam entrar serenamente nesses barris
de pólvora para zelar, como se
diz, pela "lisura do pleito"; que
urnas sejam levadas e retiradas
em segurança do local; que haja
plena liberdade de acesso à propaganda dos candidatos; ou que
o poder de pressão do crime organizado não se exerça sobre o
contingente dos detidos.
Tomada às vésperas do pleito,
dada a omissão dos tribunais regionais, a decisão do TSE agrega
novos fatores de perturbação a
um quadro que, por si só, já se situa fora dos padrões da lei.
Resulta disso, como é comum
no Brasil, um paradoxo. A lei que
se quer cumprir se choca com a
lei que não se cumpre, sem que
nenhuma das duas se modifique.
A solução habitual é engavetar a
ambas; mas as gavetas -como as
prisões- padecem de grave problema de superlotação.
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