São Paulo, quinta-feira, 26 de abril de 2007

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PLÍNIO FRAGA

À moda albanesa

COM A GREVE de transportes públicos convocada pelas centrais sindicais para defender os direitos dos trabalhadores, o jovem jornalista trabalhador, sem dinheiro para o táxi, chegou muito tarde, mas muito tarde mesmo, à redação. Os jornais hoje fecham suas edições cedo, e pouco depois da meia-noite só havia meia dúzia de repórteres e redatores -e também algumas almas penadas.
O jovem jornalista se assustou.
Mais com os repórteres e redatores do que com as almas penadas; com estas até conversou. Tarso de Castro aconselhou o jovem jornalista a ir para o bar, porque notícia não havia mais. Atordoado, o jovem jornalista pôs-se a caminho, mas deparou com I.F. Stone -outra alma que andava por ali, sabe-se lá por quê.
Astuto, o jovem repórter pediu ao jornalista americano, morto em 1989, conselho que lhe fosse valioso por toda a carreira. "Os governos mentem", respondeu Stone, evanescente. "E os governantes que querem se perpetuar -que são todos eles- mentem muito mais."
Esses são parágrafos de ficção.
Seria sorte de principiante um jovem jornalista, se encontrasse, reconhecer e dar ouvidos a Isador Feinstein Stone, formado em filosofia e "jornalista radical".
Se santa Clara é a padroeira da televisão, I.F. Stone tem de ser elevado a padroeiro dos blogueiros.
Em 1953, criou seu próprio jornal político, "I.F. Stone's Weekly", um panfleto solitário, como um blog, que chegou a ter 70 mil assinaturas e com o qual desafiou presidentes durante 18 anos, até fechá-lo, em 1971. Só deixou de escrever ao morrer, em 1989, mas sem precisar ter se corrigido: os governos continuavam mentindo.
Anteontem, o presidente do PT, Ricardo Berzoini, defendeu que é preciso controlar o "poder dos meios de comunicação no processo eleitoral". Teve o apoio do deputado federal José Genoino, também ex-presidente do PT, que alegou que "algumas instituições encarnam o bem e fazem um julgamento preconceituoso e elitista do que consideram o mal, numa tentativa de tirar-lhe a legitimidade política".
Berzoini e Genoino reavivam assim o fantasma do "controle social da mídia". Para os dois, imprensa boa deve ser a da Albânia. Como se sabe, jornalismo à moda albanesa, sutilmente apregoado pelos petistas, tem lado e mesmo lado -outro, só no paredão.
No fundo, são pífios seguidores do general Costa e Silva (outro fantasma), que ao menos tinha a virtude da sinceridade ao se dirigir a uma nobre dona de jornal: "Não é crítica construtiva o que quero. É elogio mesmo".
Os fantasmas, como provam Berzoini e Genoino, estão à solta e ainda se divertem.


PLÍNIO FRAGA é coordenador da Sucursal do Rio.

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