São Paulo, quinta-feira, 26 de maio de 2005 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES A ilusão da política de juros exorbitantes
CHARLES A. TANG
No fim do governo Collor, o Brasil tinha R$ 30 bilhões de dívida interna líquida e cerca de US$ 110 bilhões de dívida externa. Atualmente, a dívida interna líquida atinge R$ 1 trilhão e a nossa dívida externa dobrou. Em dez anos, um PIB inteirinho -a soma das riquezas do Brasil- foi investido nessa política de manutenção da aparência de estabilidade monetária. E qual foi o retorno obtido pela sociedade brasileira desse gigantesco investimento, feito com tanto sacrifício e privações pelo povo brasileiro? Durante a crise asiática de 1997, a China deu uma boa demonstração do que é a verdadeira estabilidade monetária. A um grande custo para si, ela foi a única nação asiática que, na época, não desvalorizou sua moeda. Esse sacrifício foi feito para ajudar a manter a estabilidade regional e, mesmo, a mundial. Apesar disso, a economia chinesa cresceu 8,8% naquele ano, quando já detinha mais de US$ 150 bilhões em reserva de divisas. Pode se criar a estabilidade monetária mediante a estagnação econômica de uma nação, a manutenção da pobreza e a elevação do nível da sua dívida interna e externa a níveis mirabolantes? Uma verdadeira estabilidade monetária não se cria com pobreza e dívida. Ela é conseguida por meio de formação de riqueza com crescimento econômico e acúmulo de reservas em divisas. Nos últimos 30 anos, o nosso país se baseou numa visão monetarista com sérios erros de concepção e de percepção. Assim, passamos por um círculo vicioso de períodos de inflação, combatidos com períodos de recessão autocriadas. A brilhante teoria de Chicago, que é, na verdade, um instrumento de administração pública que utiliza crédito, juros e câmbio como ferramentas, foi erroneamente usada como a única solução para todos os problemas de crescimento econômico do Brasil. Assim, ante nossa incapacidade de criar riquezas, somos reconhecidamente excelentes administradores monetaristas de nossa pobreza. Não é fácil manter essa aparente estabilidade em que vivemos usando somente a ferramenta de juros exorbitantes. Tantos planos e pacotes econômicos foram criados para testar essas teorias monetaristas e elas sempre resultaram em vãos sacrifícios para o povo brasileiro. Um povo que sempre acreditou e apoiou esses planos porque eram tidos como resposta para seus sonhos e esperanças de dias melhores. Os nossos milagrosos planos econômicos também eram todos voltados internamente para o país, como se a nossa economia fosse de tamanho suficiente para que, da nossa miséria, pudéssemos gerar a poupança necessária para ser a alavanca do nosso crescimento econômico. Esquecemos que a nossa economia, embora geograficamente grande, em termos financeiros não é tão expressiva. Com o fim da Revolução Cultural e a morte de Mao Zedong, a nova liderança chinesa pôde promover o desenvolvimento a partir da compreensão de que, para poder prosperar, era necessário obter receita e que, desde o início da história, uma nação sempre formou sua riqueza vendendo para outras nações. Foi assim que Deng Xiaoping, a partir de 1978, conseguiu transformar a nação chinesa em uma grande máquina de exportação. Da mesma forma, todos os tigres asiáticos, que não são socialistas, formaram, antes mesmo da China, sua riqueza e prosperidade mediante a adoção de uma política econômica mercantilista. O nosso país só conseguiu reconhecer essa obviedade em 2001, quando, em seu último ano de governo, o então presidente Fernando Henrique Cardoso alertou para o fato de que, para crescer, o Brasil tinha que "exportar ou morrer". Todavia, de tão obcecados pela política de juros altos, continuamos adotando esse modelo de política econômica que, ao longo das últimas décadas, tantos danos tem causado ao nível social e econômico de nosso povo. O professor Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de economia em 2001 e professor da Universidade de Colúmbia, já afirmou que as políticas econômicas de liberalização, privatização e estabilização conhecidas como "consenso de Washington", imposta nas duas últimas décadas, não levaram os países que a adotaram ao desejado efeito de crescimento econômico. Ao contrário, países como a China, que seguiram um modelo de política econômica sem subordinação ao FMI, conseguiram melhores resultados. Charles Andrew Tang, membro do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, do Conselho Internacional do governo de Wuhan e conselheiro econômico do governo do município de Jilin, é presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China. Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Roberto Romano: Renasce a censura Índice |
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