São Paulo, quinta-feira, 26 de junho de 2008

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Crédito farto

O ritmo de expansão do endividamento das pessoas físicas começa a ceder, mas o momento ainda requer cautela

O ESTOQUE de empréstimos bancários ultrapassou R$ 1 trilhão, o equivalente a 36,5% do PIB em maio de 2008. Esse ciclo de expansão do crédito tem sido liderado pelas operações com as pessoas físicas, que chegaram a 46% do volume total. Com isso, as famílias passaram a deter, na média, ao menos três dívidas: o financiamento da casa própria, o do carro e o do consumo -por meio do crédito consignado, do empréstimo pessoal, do cheque especial ou do cartão de crédito.
A expansão do endividamento das famílias foi impulsionada pelo crescimento da renda e do emprego, mas também pela redução das taxas de juros (no crédito consignado) e pelo alongamento dos prazos (na compra do automóvel e de eletrodomésticos). A despeito desse processo virtuoso, os empréstimos para as pessoas físicas continuaram caros, e os prazos, relativamente curtos. Em maio, a taxa média de juros nessas operações era de 47,4% ao ano, e o prazo médio, 457 dias.
O alto endividamento das famílias começa porém a gerar inquietação. Segundo o Sistema de Informações de Crédito do Banco Central, cresceu o número de clientes com elevado volume de dívidas. Em dezembro de 2005, 10,6 milhões de pessoas tinham dívidas acima de R$ 5.000; em fevereiro deste ano, esse número havia crescido para 15,6 milhões.
O elevado endividamento das famílias, em um contexto de alta dos juros e redução do ritmo de crescimento da renda e do emprego, poderá ampliar a inadimplência. Segundo o Banco Central, o índice médio de inadimplência (parcelas com atraso superior a 90 dias) nas operações de crédito a pessoa física teve pequena alta: de 7,1% em abril para 7,3% em maio. A maior inadimplência foi registrada na aquisição de bens -13,2% em maio.
Tais indicadores ainda não revelam variações muito acentuadas. Todavia, o orçamento familiar disponível para pagar o serviço das dívidas pode estar próximo do limite. A expansão no uso do crédito rotativo do cartão (30,4% em 12 meses) indica dificuldades para honrar todos os compromissos mensais. Esse tipo de dívida cobra juros muito elevados, perdendo apenas para o cheque especial.
O aumento dessa modalidade de crédito exige mais renda no futuro para honrar os juros, dificultando a manutenção dos fluxos de pagamento e desencadeando uma contração do consumo, em um círculo vicioso: se o desemprego se elevar, as famílias vão interromper os pagamentos, levando os bancos a reduzir as operações e a restringir o refinanciamento dos devedores.
A fim de evitar uma deterioração acentuada do ciclo de crédito, a autoridade monetária e as instituições financeiras devem monitorar o aumento do risco no interior do sistema. Os dados de maio mostram que o ritmo de expansão das operações começou a arrefecer. Os consumidores tomaram menos créditos, e os bancos ficaram mais rigorosos na seleção dos tomadores. É um bom sinal no sentido de moderar a expansão dos empréstimos -sobretudo para as pessoas físicas.


Próximo Texto: Editoriais: Ruth Cardoso

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