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JOSÉ SARNEY
Pastel de vento
A crise brasileira começou antes
de a farra das grandes transnacionais americanas ser descoberta. Inflaram balanços para simular lucros e especular na Bolsa, valorizando suas
ações. Deu no que deu e vai dar.
Aqui se dizia que a alta do dólar, a
queda nas Bolsas e a fuga de capitais
eram provocadas pelo fantasma Lula.
O presidente da República deu início
ao pânico quando anunciou que a
eleição do candidato do PT iria fazer o
Brasil "virar uma Argentina".
Agora, o presidente do Banco Central, Armínio Fraga, mais realista,
abandona o argumento político e pretende atrelar a nossa crise à americana, como reflexo desta.
A César o que é de César. O problema americano é a ponta do iceberg.
Pode ser a primeira crise mundial da
globalização financeira, do neoliberalismo, e era esperada. Há quatro anos
Alan Greenspan, presidente do Federal Reserve americano, alertou que o
alto valor das ações estava inflado, que
era necessário um corretivo. Ouvi de
Helmut Schmidt, ex-premiê da Alemanha e um dos maiores políticos do
século 20, que a economia virtual de
papéis era de dez vezes a economia
real -isto é, o preço das ações e de
outros títulos que circulam nos mercados vale um décimo dos ativos das
empresas. O Japão já passou por essa
queima de gordura. Era o paraíso, virou, naquele tempo, o inferno.
Então, está no ar um pastel de vento,
cheio de valores fictícios, que não correspondem à economia real. Agora,
está furando e já atingiu o Brasil, onde
o preço das ações das empresas na
Bolsa acumula uma queda de US$ 50
(cinquenta) bilhões!
O balanço do governo Fernando
Henrique também foi inflado para simular lucros, que agora se transformam em dívidas de R$ 600 bilhões. A
senhora Krueger, vice-diretora do
FMI, veio nos visitar. Essas visitas não
são para abobrinhas. Agora surge a
verdade. O FMI quer segurar o Brasil,
responsável por 10% da dívida mundial, e vai aportar mais US$ 20 bilhões
para evitar a moratória. Esta, afinal,
virá, segundo o banco Bear Stearns.
Seu economista-chefe, David Malpass, foi categórico: "Se não houver
mudança na política econômica, virá
a moratória. O problema do Brasil é a
falta de crescimento econômico. O socorro do FMI adia a moratória para
depois das eleições".
Enquanto isso, Ciro passa a barreira
dos 30% e Serra segue a maldição da
descida, para 14%. Não há mais dúvidas sobre um segundo turno entre Lula e Ciro. E o presidente disse que Serra é difícil, já está perdido, e que ele
sempre admirou a competência de Ciro (!)... A era FHC encerra-se, assim,
com o Brasil falindo.
Os três ícones do neoliberalismo na
América Latina, Menem, FHC e Salinas, não se deram bem.
Como dizia Sancho Pança nos seus
brocados, "onde se pensa que há toicinho, não há sequer espeto".
José Sarney escreve aos sextas-feiras nesta coluna.
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