São Paulo, sábado, 26 de julho de 2008

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GUSTAVO FRANCO

O problema dos juros

ENGANA-SE quem acha que a comunidade dos economistas, a começar pelos de formação e persuasão convencional, está satisfeita em ver o Brasil na vergonhosa posição de campeão mundial de juros. Ao contrário, o grande desafio da profissão, nos dias que passam, é justamente o de criar as condições para que o Brasil pratique taxas de juros normais, de um dígito, em conseqüências das quais o país possa ter taxas de crescimento substancialmente maiores que as de hoje. E tudo começa pelo diagnóstico.
Este desafio é semelhante em muitos aspectos ao que, no passado, era oferecido pela hiperinflação. Talvez seja, inclusive, um prolongamento deste. Uma dessas semelhanças tem a ver com ilusões sobre a existência do problema e sobre a facilidade da solução. Tal como no caso da hiperinflação, não devemos nos conformar com a idéia que a inflação alta, e os juros altos, não machucam, ou que são parte da "normalidade".
Porém, disso não se segue que existe uma solução fácil para o problema, de natureza administrativa, que demora a ocorrer por conta da escassez de heróis ou do excesso de crueldade.
Era errado pensar que a inflação se resolvia com a simples decisão de interromper a impressão de papel pintado, ou com algum "truque inteligente" para se eliminar a "inércia".
É igualmente tolo imaginar que uma "canetada" do presidente do Banco Central pode trazer a taxa de juros para 6% anuais. E que, aproveitando o mesmo decreto, se poderia fixar logo o câmbio num nível em que ninguém se queixe de "populismo cambial".
Seria ótimo que fosse tão fácil.
Todos os que passaram pelo BC, sem exceção, adorariam ter esses super-poderes. Como seria bom se políticos e burocratas bem intencionados pudessem revogar as leis da economia para fazer o Bem!
O fato é que existem fatores objetivos que dão limites muito claros ao que o BC pode fazer com juros e câmbio. Estamos falando aqui principalmente de leis da economia, ou dos chamados "fundamentos", mas também de determinações próprias da democracia, como as que resultam das determinações do presidente da República sobre a meta de inflação que o BC deve perseguir.
Mas, independentemente de variações conjunturais, o Brasil não tem juros altos por que o BC é monetarista ou neoliberal, mas por que o crédito público no Brasil, ou as nossas contas públicas, ainda estão muito desarrumadas para que tenhamos juros de Primeiro Mundo. É a mesma bactéria que provocou a "híper", agora bem menorzinha, mas ainda danosa o suficiente para manter os juros onde estão.

gh.franco@uol.com.br


GUSTAVO FRANCO escreve aos sábados nesta coluna.


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