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O rap da empulhação
Lula venceu, pede propostas, pede mais crescimento, não sabe a quem, não sabe como e gira em círculos
VITORIOSO NAS eleições, o
presidente Lula passou
a trilhar nas últimas semanas um percurso
melancólico. Investe o capital
obtido nas urnas em promessas
vagas e messiânicas de aceleração do crescimento econômico,
enquanto a realidade dos acordos partidários se impõe no tráfico fisiológico de sempre.
Seja nas conversações entre os
formuladores de seu partido, seja nos encontros com os líderes
de uma provável base de governo, o que ressalta nas atitudes de
Lula é a falta de alternativas e soluções para o impasse econômico em que se encontra o país.
No círculo presidencial se chega à conclusão de que é preciso
investir na habitação popular,
doar dinheiro para famílias pobres conquistarem moradia. Algo parecido com uma idéia, enfim. Mas a caridade seria feita a
expensas alheias, com a poupança do trabalhador forçado a contribuir todo mês com o FGTS.
Outro lampejo: incentivos bilionários para empresas que
constroem fábricas, expandem
linhas de produção e compram
máquinas; alívio no INSS para
firmas que empregam muito.
Não se lobriga, no entanto, como
a conta vai fechar. Por que meios
o Tesouro será ressarcido da benevolência ninguém diz -ou
deixa para divulgar a fatura mais
à frente, embutida num pacote
de Natal enviado ao Congresso.
Há que cortar gastos. Mas onde? Contra quem? Taxas pífias
de investimento público ameaçam estrangular qualquer projeção otimista para o PIB dos próximos anos. Aumentá-las, pela
via de um acréscimo na carga tributária, surge no atual ambiente
econômico como temeridade a
que, nem mesmo em seus acessos mais delirantes -e rápidos
quando se trata de verberar a liberdade de imprensa-, o petismo se arrisca a praticar.
Propor uma reforma tributária
que elimine as distorções em vigor -amplamente favoráveis às
pessoas de renda mais alta, enquanto penalizam o assalariado
de baixa renda- não consta da
agenda presidencial.
A redução nos gastos da Previdência, envolvendo reforma
num sistema que cerca de privilégios parcelas importantes da
população, ainda em plenas condições de atividade, esboça-se
sem clareza, e sem garantias de
viabilização política, nos bastidores da composição ministerial.
Esta se faz, afinal, sem rumos,
sem propósito, sem programa. O
lema da retomada do crescimento se repete com a monotonia de
um rap, de uma ladainha, de uma
ação de graças: Lula venceu, quer
o crescimento, não sabe como,
pede propostas, ministros virtuais se apressam, são tímidos e
medíocres, Lula não está contente, Lula pede mais propostas,
seus aliados pedem mais cargos,
Lula pede mais crescimento, não
sabe a quem, não sabe como.
Nesse nauseante bate-estaca
se apresenta, enfim despojado
dos marqueteiros, o político que
a maioria reconduziu ao Planalto: desnorteado e conciliatório,
vago de propostas e confuso, girando em torno do próprio eixo
no ritmo da empulhação.
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