|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CLÓVIS ROSSI
"Não acredito mais"
SÃO PAULO - A percepção de que a administração George Walker Bush
violou regras básicas de comportamento não é apenas dos franceses ou
das massas que se manifestam, dia
sim, outro também, nas ruas de incontáveis cidades do mundo.
Está presente até no Departamento
de Estado, do que dá forte testemunho a carta de renúncia ao serviço diplomático encaminhada ao secretário Colin Powell por John Brady Kiesling, conselheiro político da embaixada dos Estados Unidos em Atenas até
o dia 7 deste mês.
Kiesling diz, na carta, que servir como diplomata norte-americano era
"o emprego dos sonhos". Tradução:
não entrou na carreira para enriquecer, subir na vida ou coisa parecida,
mas por pura convicção (ou sonho).
Tampouco era um cidadão que já
tivesse desconfianças em relação a
seu país. Na carta, Kiesling diz: "Minha fé em meu país e em seus valores
era a mais poderosa arma no meu
arsenal diplomático".
O governo Bush violou sua fé. Escreve o ex-diplomata: "Até esta administração, tinha sido possível acreditar que, ao sustentar as políticas do
meu presidente, eu estava sustentando os interesses do povo americano e
do mundo. Não acredito mais".
É evidente que os Estados Unidos
não vão ficar menos poderosos nem
mal defendidos com a ausência de
Kiesling do serviço diplomático.
Mas é igualmente evidente que
romper valores e violar a fé de seus
próprios cidadãos acaba tendo, a médio e a longo prazo, um efeito corrosivo sobre o moral de uma sociedade.
E a grande força dos EUA está dada
menos pelos seus Tomahawks, pelos
seus B-52s e pelas mães de todas as
bombas do que pela convicção da
maioria do seu público de que eles
são súditos de um grande império,
sim, mas do império do bem.
A questão é saber quantos americanos, com o tempo, também dirão:
"Não acredito mais".
Texto Anterior: Editoriais: DEFESA SANITÁRIA Próximo Texto: Brasília - Eliane Cantanhêde: Um por todos, todos por um Índice
|