São Paulo, terça-feira, 27 de abril de 2004 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES LPM é continuidade de FHM?
ANDRÉ FRANCO MONTORO FILHO
No Brasil, é comum que o insucesso de uma política específica levante questionamentos sobre os próprios fundamentos dessa política e demandas por mudanças radicais. Infelizmente essas proposições, na sua maioria inviáveis, tendem a alcançar grande repercussão na mídia e na opinião pública -enquanto propostas de mudança que obedeçam aos procedimentos-padrão são consideradas insuficientes. Desde abril de 2003 tenho defendido, na ilustre companhia de um grande número de economistas, que o Banco Central poderia promover uma redução dos juros Selic mais acentuada do que a que efetivamente realizou, sem comprometer as metas de inflação. Em especial, minha análise indicou que essa queda poderia ter se iniciado em abril de 2003 -o Copom só começou a redução em junho daquele ano e, mesmo assim, uma redução quase simbólica. Entendo também que não se deveria ter parado a trajetória de queda no início de 2004. Nesses termos, a taxa de juros Selic poderia estar, no mínimo, dois pontos percentuais menor do que efetivamente se encontra hoje. Mas faria isso grande diferença? Afinal, essa redução mais acentuada, argumentariam os críticos radicais, não livraria o Brasil das garras dos grandes banqueiros especuladores internacionais ou das amarras do FMI, não significaria nenhuma ruptura com o (mal)dito neoliberalismo etc. Basta fazer alguns cálculos simples, baseados em hipóteses plausíveis, para que fique clara a grande diferença que representam 2% a menos de juros básicos. Em primeiro lugar, o efeito direto sobre os juros pagos. Com taxas menores (menos dois pontos percentuais) haveria uma economia, com a redução no pagamento de juros, da ordem de R$ 9 bilhões no ano. Além disso, juros menores levam a um maior crescimento do PIB. Vamos supor que, com juros de dois pontos percentuais a menos, o PIB teria crescido de 1% a mais. Isso significa uma produção de bens e serviços de R$ 15 bilhões a mais, dos quais no mínimo um terço é arrecadação do governo, ou seja, as receitas públicas seriam R$ 5 bilhões maiores do que foram. Com o PIB crescendo 1% a mais, o superávit primário, necessário para manter constante e até declinante a relação entre dívida e PIB, cairia em R$ 7,5 bilhões. Somando esses três efeitos, o setor público disporia de cerca de R$ 21,5 bilhões a mais para realizar seus investimentos e programas sociais. Esse não é um valor banal. Para comparação, os recursos disponíveis a investimentos no Orçamento federal, para este ano, somam um pouco mais de R$ 9 bilhões, e o total realizado em 2003 foi R$ 6,5 bilhões. Em adição a esse expressivo efeito positivo sobre as finanças públicas, devemos considerar que menores taxas de juros estimulam o emprego. É difícil quantificar esse efeito, mas certamente o aumento do desemprego ocorrido no último ano não teria se verificado. E é provável que teríamos tido até uma pequena redução. Tendo em vista esses resultados e o fato de que a situação atual, tanto da economia brasileira como da economia internacional, claramente ainda permitem reduções acentuadas das taxas de juros, não podemos perder tempo com filigranas, mas sim exigir uma postura mais responsável de redução da taxa de juros Selic. André Franco Montoro Filho, 60, economista, doutor pela Universidade Yale (EUA), é professor titular da Faculdade de Economia e Administração da USP. Foi secretário de Economia e Planejamento do Estado de São Paulo (gestões Mário Covas e Geraldo Alckmin). Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Jorge Boaventura: Pervertidos e cruéis Índice |
|