|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CARLOS HEITOR CONY
Amor-próprio ferido
RIO DE JANEIRO - Mais por cautela do que por temperamento, não
sou dado a exaltações, mesmo assim, volta e meia me descubro um
carioca exaltado, apesar dos milhões de motivos que o Rio me dá
para a vergonha própria e a miséria
coletiva. Em momentos de fossa urbana, não adianta pensar no Cristo
do Corcovado, em Machado de Assis ou nas garotas de Ipanema. A solução é enfiar o rabo entre as pernas
e assumir o mico de ter nascido e de
viver numa cidade com tantos e tais
problemas.
Foi uma foto quase inocente que
vi nos jornais. No convés do porta-aviões George Washington, que está fundeado na baía, tendo ao fundo
um dos nossos símbolos mais queridos, o Pão de Açúcar, um marinheiro norte-americano passa nos
braços e no rosto o repelente contra
os mosquitos da dengue.
De tanto ver documentários
mostrando como se constroem, se
armam e se defendem as poderosas
máquinas de guerra, não podia imaginar que em seu arsenal, cheio de
mísseis atômicos, radares, rastreadores de satélites e suprimentos capazes de sustentar uma cidade de
4.000 habitantes, houvesse um carregamento especial de prosaicos repelentes, desses que compramos
nas pacíficas farmácias locais.
Aliás, e creio já ter comentado em
crônica anterior, de tanto ver documentários sobre a construção de
porta-aviões, acho que, se me derem equipamento adequado e material bastante, eu serei capaz de
montar um deles, aqui mesmo, para
flutuar na lagoa, em frente à minha
varanda. Desde o corte da primeira
chapa de aço à instalação do aparelho de som com os acordes do "Anchors Away".
Só não poderia imaginar a necessidade de nossos repelentes domésticos. Será um dos itens mais fáceis
de obter. Tenho um generoso estoque no banheiro para o que der
e vier.
Texto Anterior: Brasília - Eliane Cantanhêde: Gol contra Próximo Texto: Antônio Ermírio De Moraes: Abra o olho, Brasil! Índice
|