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AS ARMAS FORA DA LEI
Princípios, teorias, números e
comparações internacionais apresentados no debate entre os que defendem e atacam o direito de possuir
armas de fogo não têm parecido suficientes para fundamentar uma posição conclusiva sobre o assunto.
Argumentos de cunho moral, legalista ou teórico dificilmente são decisivos. O direito à vida, por exemplo, é
invocado tanto por quem rejeita como pelos que apóiam o projeto de lei
que proíbe venda e posse de armas.
A lei de resto não teria por si a virtude de fazer baixar o número de mortos a bala, o que dependeria do esforço do Estado em implementar as novas normas e da disposição social em
aceitá-las. Se é assim, se o sucesso da
lei depende de uma equação a ser resolvida na prática, talvez existam alternativas mais eficazes para obter o
efeito desejado, menos homicídios.
Há ainda quem defenda a proibição
de armas como maneira de alterar a
mentalidade social, o modo como a
sociedade encara a violência. Dessa
perspectiva, a posse de armas alimenta o individualismo, a crença de
que a defesa pessoal e a segurança
pública andam juntas. Desarmados,
os cidadãos tenderiam a buscar soluções coletivas para o problema.
Pode ser, ou não; de todo modo, o
argumento envolveria um confronto
de posições irreconciliáveis sobre o
que deve ser a sociedade, com o que
se torna quase impossível chegar a
um acordo sobre argumentos de ordem mais prática, que digam respeito à efetividade de uma lei que está
sendo proposta aqui e agora.
Quanto às estatísticas, elas são inconclusivas ou imperfeitas; não permitem prever que, mesmo efetiva, a
lei possa provocar queda expressiva
no morticínio. Cidadãos sem histórico policial, com armas legais, são a
grande minoria dos homicidas. "Se
for poupada uma única vida, já vale a
pena", diz porém o rabino Henry Sobel em defesa da proibição.
O argumento é respeitável, como
todos aqueles orientados pelo desejo
de minorar o massacre de cerca de 38
mil pessoas por ano no Brasil, mortas a bala. Mas, mais uma vez, tal tese
não leva em conta que entre o ideal
do desarmamento e a sua prática vai
uma distância grande e coberta de
obstáculos. Há ineficiência e insuficiência policiais. É amplo e fácil o comércio ilegal de armas. Dada a carência de recursos para a segurança
pública, é difícil sustentar que a prioridade policial deva ser a apreensão
de milhões de armas registradas.
Pesquisa Datafolha registrou opiniões algo contraditórias sobre a
proibição de armas: 77% dos brasileiros são a favor de que os donos de
armas legais as entreguem ao governo, mas 45% defendem que continue
o comércio dessas mesmas armas.
O número de portes e registros de
armas cai muito no país desde 97,
quando foi aprovada legislação restritiva sobre o assunto. Em São Paulo
foram expedidos 69 mil portes em
94. Em 98, eles foram 2.000. Nesse
ano, a venda de armas caiu para um
quinto, 6.000, do que era em 95.
O armamento legal está, pois, sendo reprimido. Decerto há um enorme
estoque de armas de fogo legais em
mãos do público. Um novo e amplo
recadastramento talvez servisse para
checar se elas ainda estão em boas
mãos. Mas reprimir cidadãos em dia
com a lei parece por ora desperdício
de recursos bem escassos.
O esforço policial deveria ser dirigido para capturar as armas dos criminosos. A idéia de desarmar a sociedade deve permanecer como objetivo final -tiroteios entre indivíduos,
mesmo contra bandidos, não significam segurança, mas algo como guerra civil. Mas há que ter senso de prioridade para alcançar o objetivo básico, que é o de reduzir o espantoso
número de mortes violentas no país.
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