São Paulo, terça-feira, 27 de julho de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Homeopatia e preconceito

MARCUS ZULIAN TEIXEIRA


Posturas preconceituosas de ambas as partes dificultam o diálogo entre racionalidades médicas distintas, impedindo que pacientes se beneficiem


Em todas as épocas, incomodados com posturas preconceituosas dos seus pares, pensadores e cientistas definiram esses julgamentos formados sem maior conhecimento dos fatos: "O preconceito é uma opinião não submetida à razão" (Voltaire); "Triste época! É mais fácil desintegrar um átomo que um preconceito" (Einstein).
Apesar de a ciência ser uma área do conhecimento que busca estudar os fenômenos e seus princípios, devendo isentar-se de preconceitos para cumprir o seu ideal, o "orgulho científico" entorpece a mente dos pesquisadores, fazendo-os desprezar aquilo que desconhecem.
A história da humanidade está repleta de exemplos em que determinadas teorias consideradas "polêmicas" perante o modelo científico de uma época tornaram-se leis inquestionáveis no futuro, em vista do aperfeiçoamento dos métodos de investigação.
Infelizmente, duas matérias publicadas no caderno Ciência deste jornal ("Descobridor do HIV defende a polêmica memória da água" e "Pesquisa rendeu Prêmio Ig Nobel a francês", 30/6), exemplificam o preconceito científico dos autores, que ironizam os recentes estudos do pesquisador Luc Montagnier (Prêmio Nobel de Medicina em 2008), que trazem novas evidências à teoria da "memória da água", endossando as "ultradiluições homeopáticas".
Transmitindo aos leitores visão parcial dos fatos, os autores questionam o "brilhantismo" do ganhador de um Prêmio Nobel, a "qualidade científica" de suas publicações e a sua "capacidade de juízo".
Como o currículo do pesquisador torna essas críticas inócuas, ressaltamos que outras pesquisas, não citadas nas matérias, evidenciam a "atividade biológica"" das "ultradiluições homeopáticas".
Madeleine Ennis (farmacologista britânica) publicou estudos multicêntricos no periódico "Inflammation Research" (1999, 2001 e 2004), que confirmam os resultados da pesquisa de Jacques Benveniste publicados na revista "Nature" (criticada nas matérias).
Apesar do viés "anti-homeopatia", a pesquisadora declarou-se surpresa com os resultados, que não puderam ser explicados pela farmacologia. Outros modelos, citados em revisões no periódico "Homeopathy" (em 2009 e 2010), mostraram a atividade biológica das preparações homeopáticas.
A "memória da água" também foi estudada em modelos físico-químicos, tendo suas pesquisas publicadas em revisão no periódico "Homeopathy" (2007).
Como exemplo, Louis Rey constatou a "informação" das ultradiluições homeopáticas no estudo da termoluminescência das substâncias ("Physica A", 2003).
Contrapondo o movimento contracultural homeopático, que despreza a importância da pesquisa em geral, defendemos a fundamentação científica dos pressupostos homeopáticos, buscando uma linguagem comum que aproxime ambos os paradigmas e permita a prática de uma medicina integrada.
No entanto, posturas preconceituosas de ambas as partes dificultam o diálogo entre racionalidades médicas distintas, impedindo que os pacientes se beneficiem com a união ética e consciente dessas opções terapêuticas.


MARCUS ZULIAN TEIXEIRA, doutor em medicina, é médico homeopata e pesquisador da Faculdade de Medicina da USP.
E-mail: mzulian@usp.br .


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