|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
debates@uol.com.br
O apoio de Lula será um fator decisivo
nas eleições municipais deste ano?
NÃO
O efeito decisivo e o efeito marginal
JAIRO NICOLAU
A
CAMPANHA eleitoral deste
ano tem reforçado duas tendências já vistas em eleições
anteriores. Na falta de nome melhor,
vou chamar a primeira de rotinização
das campanhas.
Desde a redemocratização, esta é a
sétima eleição para prefeitos e vereadores. As eleições já não são mais a
novidade que eram na década de 80.
Aos poucos elas foram assumindo um
caráter menos excepcional e mais rotineiro. As campanhas ficaram mais
curtas, mais concentradas na TV, viram a maioria dos militantes voluntários desaparecerem, poluem menos
as cidades e despertam menos interesse dos eleitores e da imprensa.
Vejo a cobertura rarefeita que a
campanha tem recebido dos jornais
neste ano e lembro dos cadernos especiais de outras disputas. Observo os
carros sem adesivos e lembro de eleições passadas, quando avaliava a força do candidato contando os adesivos.
A segunda tendência é a concentração da discussão da campanha nos temas locais. Aos poucos, eleitores vão
aprendendo quais são as reais atribuições do prefeito. Aprendem que ele
tem responsabilidade pelo trânsito da
cidade, mas pouco pode fazer para gerar emprego em larga escala. Aprendem que as prefeituras podem cuidar
bem da educação infantil, mas não da
superior. Aprendem que, por mais
que se diga o contrário, a responsabilidade maior pela segurança pública é
do governador, e não do prefeito.
Cada cidade tem sua agenda particular. Em algumas, a disputa assume
um caráter plebiscitário, sobretudo
quando o prefeito atual concorre à
reeleição. Em outras, a disputa se dá
em torno de umas poucas famílias/
grupos dominantes. Em alguns lugares, os partidos influenciam mais a
disputa. Em outros, vale o peso de lideranças carismáticas. Mas, em quase todas elas, candidatos e eleitores
estão pensando nos problemas e soluções de sua cidade, de costas para o
que acontece em outros lugares.
Não conheço candidato a prefeito
que tenha sido vitorioso falando de
temas nacionais ou concentrando seu
programa em grandes questões doutrinárias. A última vez que a política
nacional influenciou para valer uma
disputa para prefeito foi em 1988,
quando o Exército invadiu a CSN,
matou e feriu trabalhadores. O evento, ocorrido poucos dias antes do pleito, comoveu o país e produziu uma
maré de votos para os partidos de esquerda nas maiores cidades.
Alguns analistas e parte da imprensa parecem não gostar da tendência
ao municipalismo das eleições e buscam desesperadamente sinais de nacionalização. A premissa é que uma
eleição municipal determinará a disputa de dois anos depois. 2008 teria
que explicar 2010. Por isso, tanto espaço para os bastidores da escolha em
Belo Horizonte. Por isso, a importância da disputa na cidade de São Paulo.
Por isso, o presidente deve influenciar decisivamente o pleito deste ano.
Porém, as evidências dessa associação são tênues. Para ficar em um
exemplo: em um estudo, comparei os
votos obtidos por Lula em 2008 com
os dos PT em 2006 e descobri que a
associação estatística entre eles é praticamente inexistente.
Pelo que vi em outras campanhas e
pelo que tenho acompanhado nesta,
continuo convencido de que as eleições municipais são movidas basicamente pelos temas locais. Os atores
externos à vida municipal têm quase
sempre efeito marginal sobre o resultado final da disputa.
Quando sugiro que as coisas se passam assim ouço a pergunta inevitável:
não será diferente com Lula? Não
adianta lembrar que já houve uma
eleição em 2004, no meio do primeiro
mandato de Lula, e que os efeitos de
seu apoio não foram tão expressivos.
A confusão talvez ocorra por conta
do que cada um de nós chama de influência. Ou, como está na pergunta
de hoje, o que cada um entende como
"fator decisivo". Não duvido de que o
apoio do presidente possa ajudar alguns candidatos a subir um pouco.
Em uma disputa muito acirrada,esses
pontinhos podem até fazer a diferença. Mas isso não é o mesmo que dizer
que o apoio do presidente é decisivo.
Dito de outra maneira: sem boas
propostas para a cidade, sem ser reconhecido pelos moradores como uma
liderança importante, sem conseguir
criar uma conexão com eleitores, não
há quem se eleja prefeito. Isso determina seu sucesso ou seu fracasso. O
resto é, no máximo, efeito marginal.
JAIRO NICOLAU, 44, doutor em ciência política, é diretor
de Ensino do Iuperj. Durante as eleições deste ano assina
uma coluna na veja.com .
Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Renato Lessa: Do amor na política Próximo Texto: Painel do leitor Índice
|