São Paulo, sábado, 27 de setembro de 2008

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TENDÊNCIAS/DEBATES

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O apoio de Lula será um fator decisivo nas eleições municipais deste ano?

NÃO

O efeito decisivo e o efeito marginal

JAIRO NICOLAU

A CAMPANHA eleitoral deste ano tem reforçado duas tendências já vistas em eleições anteriores. Na falta de nome melhor, vou chamar a primeira de rotinização das campanhas.
Desde a redemocratização, esta é a sétima eleição para prefeitos e vereadores. As eleições já não são mais a novidade que eram na década de 80.
Aos poucos elas foram assumindo um caráter menos excepcional e mais rotineiro. As campanhas ficaram mais curtas, mais concentradas na TV, viram a maioria dos militantes voluntários desaparecerem, poluem menos as cidades e despertam menos interesse dos eleitores e da imprensa.
Vejo a cobertura rarefeita que a campanha tem recebido dos jornais neste ano e lembro dos cadernos especiais de outras disputas. Observo os carros sem adesivos e lembro de eleições passadas, quando avaliava a força do candidato contando os adesivos.
A segunda tendência é a concentração da discussão da campanha nos temas locais. Aos poucos, eleitores vão aprendendo quais são as reais atribuições do prefeito. Aprendem que ele tem responsabilidade pelo trânsito da cidade, mas pouco pode fazer para gerar emprego em larga escala. Aprendem que as prefeituras podem cuidar bem da educação infantil, mas não da superior. Aprendem que, por mais que se diga o contrário, a responsabilidade maior pela segurança pública é do governador, e não do prefeito.
Cada cidade tem sua agenda particular. Em algumas, a disputa assume um caráter plebiscitário, sobretudo quando o prefeito atual concorre à reeleição. Em outras, a disputa se dá em torno de umas poucas famílias/ grupos dominantes. Em alguns lugares, os partidos influenciam mais a disputa. Em outros, vale o peso de lideranças carismáticas. Mas, em quase todas elas, candidatos e eleitores estão pensando nos problemas e soluções de sua cidade, de costas para o que acontece em outros lugares.
Não conheço candidato a prefeito que tenha sido vitorioso falando de temas nacionais ou concentrando seu programa em grandes questões doutrinárias. A última vez que a política nacional influenciou para valer uma disputa para prefeito foi em 1988, quando o Exército invadiu a CSN, matou e feriu trabalhadores. O evento, ocorrido poucos dias antes do pleito, comoveu o país e produziu uma maré de votos para os partidos de esquerda nas maiores cidades. Alguns analistas e parte da imprensa parecem não gostar da tendência ao municipalismo das eleições e buscam desesperadamente sinais de nacionalização. A premissa é que uma eleição municipal determinará a disputa de dois anos depois. 2008 teria que explicar 2010. Por isso, tanto espaço para os bastidores da escolha em Belo Horizonte. Por isso, a importância da disputa na cidade de São Paulo.
Por isso, o presidente deve influenciar decisivamente o pleito deste ano.
Porém, as evidências dessa associação são tênues. Para ficar em um exemplo: em um estudo, comparei os votos obtidos por Lula em 2008 com os dos PT em 2006 e descobri que a associação estatística entre eles é praticamente inexistente.
Pelo que vi em outras campanhas e pelo que tenho acompanhado nesta, continuo convencido de que as eleições municipais são movidas basicamente pelos temas locais. Os atores externos à vida municipal têm quase sempre efeito marginal sobre o resultado final da disputa.
Quando sugiro que as coisas se passam assim ouço a pergunta inevitável: não será diferente com Lula? Não adianta lembrar que já houve uma eleição em 2004, no meio do primeiro mandato de Lula, e que os efeitos de seu apoio não foram tão expressivos.
A confusão talvez ocorra por conta do que cada um de nós chama de influência. Ou, como está na pergunta de hoje, o que cada um entende como "fator decisivo". Não duvido de que o apoio do presidente possa ajudar alguns candidatos a subir um pouco.
Em uma disputa muito acirrada,esses pontinhos podem até fazer a diferença. Mas isso não é o mesmo que dizer que o apoio do presidente é decisivo.
Dito de outra maneira: sem boas propostas para a cidade, sem ser reconhecido pelos moradores como uma liderança importante, sem conseguir criar uma conexão com eleitores, não há quem se eleja prefeito. Isso determina seu sucesso ou seu fracasso. O resto é, no máximo, efeito marginal.

JAIRO NICOLAU, 44, doutor em ciência política, é diretor de Ensino do Iuperj. Durante as eleições deste ano assina uma coluna na veja.com .



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