São Paulo, quarta-feira, 27 de novembro de 2002

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ANTONIO DELFIM NETTO

Credibilidade é o nome do jogo

Estamos vivendo uma transição governamental extremamente civilizada para os padrões nacionais. Não se trata apenas das facilidades materiais criadas pelo governo para o seu sucessor, coisa que já havia ocorrido na passagem do presidente Sarney para o presidente Collor, infelizmente anulada pelo comportamento arrogante e grosseiro deste último e de sua equipe. Com os srs. Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, as facilidades materiais foram completadas por um comportamento mútuo elegante e respeitoso que deverá servir de padrão para o futuro.
O sr. Luiz Inácio Lula da Silva venceu por dois motivos: 1º) o novo programa do Partido dos Trabalhadores abandonou os últimos resquícios do socialismo romântico que odeia o mercado e pretende fabricar "uma nova civilização", que é o caminho mais curto para o fracasso econômico e a barbárie política. Com isso, tornou-se parte aceitável no jogo político definido na Constituição de 1988. Essa mudança e a eleição do seu candidato completaram o ciclo civilizatório democrático por ela estabelecido; 2º) o sr. Lula, à custa da credibilidade construída numa longa carreira política, foi capaz de transmitir esperança para uma sociedade desiludida. Uma campanha televisiva "técnica" e desinteressante, controlada por marqueteiros e burocratas, destruiu a imagem do candidato do governo, sugerindo que ele era apenas "competente". A de Lula revelou entusiasmo, emoção e compaixão. Falou da fome, da desigualdade, da injustiça, do preconceito, do desemprego, da necessidade de ascensão social (da qual ele é o exemplo vivo) e da esperança de volta a um tempo de desenvolvimento econômico e social.
Essa mesma sensibilidade ficou evidente na escolha do primeiro tema de discussão que impôs à agenda nacional depois de eleito: o programa Fome Zero. Apesar dos evidentes exageros nos números e da proposta de um mecanismo ineficiente, a "idéia" mobilizou toda a sociedade e deu alguma folga para o presidente pensar nos seus (e nos nossos!) problemas. O primeiro, e hoje o mais importante deles, é o restabelecimento da credibilidade interna e externa do país, sem as quais dificilmente ele poderá cumprir as promessas que fez:
1) Uma aceleração da taxa de crescimento do PIB, sem a qual não se reduzirá o desemprego;
2) A manutenção de uma taxa de inflação de um dígito e decrescente, o que, sem políticas fiscal e monetária adequadas, será impossível;
3) Uma redução paulatina das desigualdades sociais -que se obtém pelo aumento da igualdade de oportunidade para todos os cidadãos, que começa pela educação e pela saúde.
Mas do que depende esse restabelecimento da credibilidade? De políticas econômicas inteligentes e, principalmente, da disposição de "fazer o superávit primário necessário para estabilizar a relação dívida líquida/PIB", exatamente o que o PT prometeu na campanha.


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br



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