São Paulo, sexta-feira, 27 de dezembro de 2002

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ELIANE CANTANHÊDE

Em busca de um mundo multipolar

BRASÍLIA - O chanceler Celso Amorim nem assumiu ainda, mas já está pegando o maior rabo de foguete: o envio de gasolina para abastecer os postos da Venezuela e dar sobrevida ao governo Hugo Chávez.
Se o Brasil não ajudasse, iriam logo chamar o novo governo de covarde, por abandonar o até ontem tão elogiado Chávez às feras variadas e famintas da oposição. Se ajuda, vira um deus-nos-acuda, porque configura ingerência em questões internas de outro país e mais gás (literalmente) para as maluquices de Chávez.
É, mas a vida é dura mesmo, e o mundo anda duríssimo. Se o Brasil da era FHC se distinguiu dos EUA por condenar a tentativa de golpe contra Chávez, como justamente Lula poderia lavar as mãos e fingir que não é com ele?
O argumento do futuro governo, dito em bom e claro som por Celso Amorim, é irrefutável: as relações do Brasil são com um governo constitucional, eleito democraticamente. Pode ser de Hugo, João, Pedro ou Mané, não importa. O país não pode simplesmente entrar em colapso, sem gasolina (que ironia!), com os vizinhos tapando olhos, nariz e ouvidos.
E o que muda na política externa?
Diz Amorim: "É uma questão de novas ênfases. Dentro do país, não se vai pensar só em números e índices frios. Isso vai se refletir na política externa. Pretendemos justiça social também no plano internacional".
O que significa isso do ponto de vista prático, de relações com os países?
Amorim: "Que pretendemos um sentido humanista nas nossas relações, um sentido que vá além da ótica fria e impessoal dos mercados. Eles também são importantes, mas não são tudo. São instrumentos de uma política mais global de justiça social".
Não é muito abstrato, utópico?
Amorim: "Um pouco de utopia não faz mal a ninguém. Se a gente continuar preso ao realismo absoluto, nada vai mudar. É essa, aliás, a tese mais grata aos conservadores. Eles vivem dizendo que "é preciso ser realista". É assim que não se muda nunca".
Agora, da utopia à prática!


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