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ELIANE CANTANHÊDE
Em busca de um mundo multipolar
BRASÍLIA - O chanceler Celso Amorim nem assumiu ainda, mas já está
pegando o maior rabo de foguete: o
envio de gasolina para abastecer os
postos da Venezuela e dar sobrevida
ao governo Hugo Chávez.
Se o Brasil não ajudasse, iriam logo
chamar o novo governo de covarde,
por abandonar o até ontem tão elogiado Chávez às feras variadas e famintas da oposição. Se ajuda, vira
um deus-nos-acuda, porque configura ingerência em questões internas de
outro país e mais gás (literalmente)
para as maluquices de Chávez.
É, mas a vida é dura mesmo, e o
mundo anda duríssimo. Se o Brasil
da era FHC se distinguiu dos EUA
por condenar a tentativa de golpe
contra Chávez, como justamente Lula poderia lavar as mãos e fingir que
não é com ele?
O argumento do futuro governo, dito em bom e claro som por Celso
Amorim, é irrefutável: as relações do
Brasil são com um governo constitucional, eleito democraticamente. Pode ser de Hugo, João, Pedro ou Mané,
não importa. O país não pode simplesmente entrar em colapso, sem gasolina (que ironia!), com os vizinhos
tapando olhos, nariz e ouvidos.
E o que muda na política externa?
Diz Amorim: "É uma questão de
novas ênfases. Dentro do país, não se
vai pensar só em números e índices
frios. Isso vai se refletir na política externa. Pretendemos justiça social
também no plano internacional".
O que significa isso do ponto de vista prático, de relações com os países?
Amorim: "Que pretendemos um
sentido humanista nas nossas relações, um sentido que vá além da ótica
fria e impessoal dos mercados. Eles
também são importantes, mas não
são tudo. São instrumentos de uma
política mais global de justiça social".
Não é muito abstrato, utópico?
Amorim: "Um pouco de utopia não
faz mal a ninguém. Se a gente continuar preso ao realismo absoluto, nada vai mudar. É essa, aliás, a tese
mais grata aos conservadores. Eles vivem dizendo que "é preciso ser realista". É assim que não se muda nunca".
Agora, da utopia à prática!
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