São Paulo, quarta-feira, 28 de janeiro de 2004

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CADÁVER INSEPULTO

Não é novidade que opositores do governo de George W. Bush levantem a voz para dizer em linguagem mais ou menos diplomática que a Casa Branca, na tentativa de justificar a guerra no Iraque, mentiu ao sustentar que Saddam Hussein possuía armas de destruição em massa. As primeiras denúncias de que os serviços secretos norte-americano e britânico estavam falseando dados e os interpretando de forma sabidamente deturpada datam de antes da invasão. A novidade é que agora já não são apenas opositores de Bush que fazem essas acusações, mas também antigos colaboradores.
Na semana passada, David Kay, o inspetor-chefe de armas no Iraque, designado para o cargo pelo próprio governo norte-americano, renunciou ao posto afirmando que os temíveis arsenais de armas químicas e biológicas não existiam no período anterior à guerra. Para Kay, que foi assessor da CIA e passou os últimos meses vasculhando o Iraque em busca de provas, as armas de destruição em massa foram destruídas em meados dos anos 90 sob monitoramento da ONU. Desde então, não houve tentativas sérias de reconstruir os arsenais. O ex-inspetor, é verdade, evitou culpar Bush pelos equívocos, preferindo atribuir a responsabilidade pela falha aos serviços secretos.
As observações do ex-inspetor foram tão contundentes que o secretário de Estado dos EUA, general Colin Powell, foi obrigado a admitir que as armas de destruição em massa podem não existir. Antes da guerra, Powell foi à ONU onde fez uma apresentação para demonstrar que o Iraque possivelmente as possuía.
Em condições normais, as desinformações do período que antecedeu a invasão talvez já tivessem sido esquecidas. A verdade é sempre a primeira vítima em qualquer guerra. Mas, sendo este um ano eleitoral, as mentiras pespegadas pela Casa Branca deverão permanecer até novembro como um cadáver insepulto.


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