São Paulo, quarta-feira, 28 de março de 2001

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A hora da Lei das Sociedades Anônimas

EMERSON KAPAZ


Aprovar a Lei das SA seria a melhor contribuição do Congresso Nacional para romper a desconfiança dos investidores
Neste momento em que a crise política e a incerteza nos mercados financeiros trazem nuvens carregadas, o Congresso pode e deve dar uma demonstração clara de que é possível avançar no meio da turbulência e sinalizar com uma agenda positiva para o país. Este precisa ser o ano da maturação de grandes reformas, como a política e a tributária, além de ser o ano da votação de matérias relevantes em questões estratégicas, que vão do aperfeiçoamento da proposta do governo de correção das contas do FGTS até uma formulação de uma política nacional de resíduos sólidos urbanos.
Não podemos permitir que as eleições de 2002 tumultuem os trabalhos e joguem tais tarefas para escanteio.
No curto prazo, a melhor contribuição que o Congresso poderia dar para romper a desconfiança dos investidores e mostrar que o Brasil está maduro para consolidar um modelo auto-sustentado de desenvolvimento seria aprovar a nova Lei das Sociedades Anônimas.
A razão é muito simples: não haverá desenvolvimento sem um financiamento firme dos agentes privados. Tal financiamento é impossível sem um mercado de capitais forte, ancorado nas poupanças de investidores brasileiros e estrangeiros. Esses investidores, especialmente os minoritários, só entrarão para valer nesse mercado se tiverem garantias e direitos que lhes propiciem tranquilidade para aportarem seus recursos.
Esse é o teor do substitutivo de minha autoria, que recebeu importantes contribuições do deputado federal Antonio Kandir (PSDB-SP), dando autonomia e liberdade à CVM (Comissão de Valores Mobiliários). A essência do texto que está para ser votado cria um círculo virtuoso: ao oferecer proteção ao acionista, especialmente o minoritário, a Lei das Sociedades Anônimas deverá trazer mais liquidez ao mercado, o que, por sua vez, estimulará as empresas a lançar ações, o que atrairá mais investidores e assim por diante.
Seria desejável que a aprovação da Lei das Sociedades Anônimas ocorresse por consenso. Para que isso aconteça, falta superar quatro pontos ainda polêmicos: a participação dos minoritários nos conselhos de administração das empresas, desde que tenham mais de 10% do capital social; a participação dos minoritários nos conselhos fiscais; o estabelecimento do valor econômico -e não o patrimonial-, para efeito de avaliação da empresa no caso de fechamento do capital; e o pagamento do prêmio para os minoritários, no caso da venda do controle da empresa.
O que se busca por meio desses dispositivos é assegurar aos minoritários uma maior transparência na administração, valorizando o princípio de governança corporativa, além de assegurar garantias de que serão justamente remunerados, no caso de os controladores decidirem fechar o capital ou transferir o controle acionário a terceiros.
Se o empresariado perceber que o controlador e o minoritário fazem parte de um mesmo projeto -a melhoria da empresa-, que eles estão cada vez mais próximos e que não são partes diferentes, essa nova cultura empresarial significará um novo marco no Brasil.
O momento para aprofundar essa discussão e chegar ao consenso é agora. E só conseguiremos progredir se todos concordarem em ceder um pouco. Não avançaremos se formos excessivamente radicais nas medidas para estimular o mercado ou excessivamente conservadores, como algumas empresas que entendem que nada precisa mudar.
É fundamental chegarmos a um consenso nesses pontos, sob pena de continuarmos a esperar que os recursos para financiar nosso desenvolvimento caiam do céu. Ou pior: que, na ausência de capitais suficientes, sejamos periodicamente vítimas de investimentos voláteis, obrigando-nos a recorrer a organismos financeiros internacionais cada vez que o bolo desanda.


Emerson Kapaz, 46, é deputado federal pelo PPS-SP. Foi secretário da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo (governo Covas).



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