São Paulo, terça-feira, 28 de abril de 2009

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MARCOS NOBRE

Briga de torcidas

NÃO EXISTE Joaquim Barbosa sem Gilmar Mendes. Como não existe Ciro Gomes sem José Serra. O repetidor de clichês não vive sem o destemperado. O convencional não existe sem o tresloucado. A questão é: o que fica de um debate nesses termos, em que tudo acaba virando briga de torcidas?
O que fica é conformismo. Os clichês repetidos servem para tranquilizar de que nada está no seu devido lugar. Tranquiliza porque quem enuncia e quem ouve o clichê se sentem seguros de que não têm culpa da tragédia de tudo continuar como está.
Manda o clichê que se chame de destemperado quem acha que é preciso com urgência fazer alguma coisa. Qualquer coisa. Por estranho que possa parecer, também o ato tresloucado serve para tranquilizar. Fazer qualquer coisa não muda coisa nenhuma. Mas confirma a necessidade de agir de maneira explosiva.
Desde que o grande consenso do Plano Real se firmou, com a eleição de Lula, o debate político se dá sobre margens. Algo como decidir entre construir casas populares ou diminuir a dívida pública. Não significa que as diferenças entre as posições sejam desimportantes.
Mas está muito longe de empolgar torcidas.
Aí começa a amplificação de episódios menores, desprezíveis. Um bate-boca no Supremo passa a fazer parte da história universal. O convencional diz que algo "da mais alta gravidade ocorreu". O tresloucado acha pouco e pede uma insurreição.
O resultado é nulo. Na semana seguinte, o episódio e os personagens já estão esquecidos. As torcidas passam a aguardar ansiosamente a próxima escaramuça miúda para cantarem seus hinos de guerra. E tudo fica como está.
A lógica de torcida da discussão pública tem muito a ver com a chegada de Lula ao poder. Ao contrário do que muitos esperavam, o PT teve sucesso em se consolidar como um dos dois polos do sistema político. E isso se deve em boa medida ao fato de Lula ter sido bem sucedido em construir uma equipe de governo nova, principalmente nos escalões intermediários. Algo inédito na história brasileira, acostumada a ver sempre a mesma equipe no poder qualquer que seja o governo.
Esse importante avanço institucional até agora não ajudou o debate público. O polo tucano diz que o PT aparelha o Estado com uma equipe incompetente. O polo petista retruca que o PSDB não suporta ver que sindicalistas e ongueiros conseguem governar melhor do que o time tucano.
O fato é que a discussão só vai melhorar quando deixar de ser assunto exclusivo de torcidas organizadas. Ao menos o mundo deixaria de girar só em torno de picuinhas. nobre.a2 uol.com.br


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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