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CARLOS HEITOR CONY
Tom e Vinicius
RIO DE JANEIRO - Nos meus
tempos de redator, recebi o texto de
um repórter sobre Tom Jobim. O
texto era bom e foi aprovado com as
inevitáveis pinceladas de quem o
editou. Mas eu fiquei no meu canto,
aterrado, não pelo texto em si, que
nada tem de aterrorizante, mas pelo que Tom disse ou deixou que o
repórter dissesse por ele.
A pergunta inicial era sobre a
morte e foi formulada mais ou menos assim: "Tom, ouvimos dizer
que, depois da morte de Vinicius de
Moraes, você está preocupado com
a morte". A reposta do Tom é simples: "Realmente, depois da morte
do poeta, estou pensando muito na
morte, descobri de repente que, se
Vinicius morreu, é bem possível
que todos nós morreremos".
Se o autor de "Garota de Ipanema" falou com ironia, o repórter
não a captou. A impressão que dá, a
quem lê a entrevista, é que Tom
nunca tinha lido um jornal, nem
visto a página onde se estampam os
avisos fúnebres. Precisou que a
morte levasse a boa alma do Vinicius para que Tom começasse a desconfiar: "se ele foi, por que não eu?"
Foi necessário morrer um poeta para que esse fato tão banal na vida de
nós outros entrasse nas preocupações do nosso grande compositor.
Há momentos em que nos julgamos eternos. Faz parte de nossa cobiça. Mas, depois dos 30 anos, qualquer mortal que até então se julgou
imortal começa a desconfiar que
um dia vai para o beleléu mesmo. E,
dentro das possibilidades de cada
qual, todos se coçam e se arrumam
como podem. O corcunda sabe como se deita.
As religiões, em certo sentido,
procuram habituar o homem com a
idéia da morte. Mas, com ou sem religião, a morte é o fato mais importante da vida, e o homem será sempre um desgraçado enquanto não
aceitar placidamente a rudeza, a estupidez e a necessidade de seu próprio fim.
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