São Paulo, quinta-feira, 29 de janeiro de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

Cara e coragem

RIO DE JANEIRO - O Zé Dirceu está sendo vítima de uma choradeira geral. Ministros, ex-ministros e interessados nisso ou naquilo reclamam que o chefe da Casa Civil é quem está realmente mandando. Ora, pois, qual é a novidade nisso?
Sempre que um presidente não está preparado para o ofício de governar, que despreza a papelada burocrática e os fuxicos da engrenagem política, o chefe da Casa Civil ocupa o espaço vazio. Despacha o expediente, faz o dever de casa. Foi assim com o marechal Dutra, que teve no professor Pereira Lira o seu fac totum, foi assim com Leitão de Abreu, Juvenal Portela e Golbery, que mandaram e desmandaram no vácuo deixado por presidentes sem apetite, como no caso de Figueiredo, que gostava mais de seus cavalos do que do povo.
Quando o presidente se encarna no poder, como Vargas, JK, Jânio, Collor e FHC, a figura do seu principal subalterno fica em segundo plano. Tanto Vargas como JK tiveram vários chefes da Casa Civil, mas nenhum deles mandava, eram contínuos de luxo. Jânio e Collor duraram pouco, mas, enquanto ocuparam a presidência, não transferiram para ninguém a função de governar, para o bem ou para o mal controlaram a máquina do poder -até que acabaram no brejo.
Lula adora o poder, mas detesta a política, sua frio quando tem de nomear alguém e sua mais frio ainda quando tem de demitir. Ama o poder, mas não se considera poderoso, prefere os penduricalhos do cargo, ver os elefantes da Índia e declarar as obviedades que não cheiram nem fedem.
Dirceu é um animal político. Errando ou acertando, tem um projeto na cabeça, projeto antigo por sinal, pagou um preço por ele. Não tem o carisma de Lula, porém tem mais substância. O atual governo, no que fez de bom ou de mau até agora, tem a sua cara. Falta-lhe ainda a coragem para realizar o que sempre sonhou.


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