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REFÉM DA CREDIBILIDADE
A economia brasileira teve retração de 0,2% em 2003, primeiro ano do governo de Luiz Inácio
Lula da Silva. O Produto Interno Bruto (PIB) per capita, que é a divisão da
riqueza produzida no país pelo número de habitantes, caiu 1,5%, considerando uma estimativa de crescimento populacional de 1,3%. A retração, a pior desde 1992, foi fruto das
políticas monetárias e fiscais contracionistas adotadas pela nova equipe
econômica para debelar a forte crise
de confiança que cercou a eleição e a
posse do governo petista.
Por mais que se considere que não
haveria saída indolor para a crise, é
impossível, em nome dos resultados
obtidos, ignorar as conseqüências
nocivas das políticas adotadas, de
perfil inequivocamente conservador.
O ajuste promovido causou desemprego, queda na renda do trabalhador e retração da atividade produtiva.
O consumo das famílias caiu 3,3% e
a indústria de construção civil encolheu 8,6%. Os investimentos tiveram
queda de 6,6%. As exportações foram o único setor dinâmico, com expansão de 14,2%, impulsionando a
agropecuária e a extração mineral.
O modelo de política econômica do
governo Lula permaneceu o mesmo
que havia sido definido em consonância com o Fundo Monetário Internacional após a crise cambial de
janeiro de 1999. A economia continua ancorada em três pilares: superávit primário (de 4,25% do PIB) para
reduzir o endividamento do setor público, taxa de juro básica elevada
(16,5% ao ano) para atingir a meta de
inflação (de 5,5% em 2004) e taxa de
câmbio flutuante com livre movimentação de capitais para tentar
consolidar as contas externas.
Após o surto de expansão ocorrido
entre 1994 e 1997, que acompanhou o
início do plano de estabilização monetária, a economia brasileira passou
a apresentar um padrão descontínuo
de expansão, apelidado por alguns
de "stop and go" ou "vôo da galinha". Em 1998 e 1999, o crescimento
foi, respectivamente, de 0,1% e 0,8%.
Em 2000, ele atingiu 4,4%, mas a taxa caiu para 1,3% em 2001, com o racionamento de energia.
Durante o decênio 1994-2003, a expansão média anual da economia foi
de 2,4%, enquanto a do PIB per capita ficou em 1%. São resultados pífios
para um país que no século 20 sustentou durante décadas um crescimento médio anual de 7%.
Não se vislumbra a possibilidade
de que a economia brasileira encontre dentro do atual modelo condições para reencontrar um padrão de
crescimento sustentado que coloque
o país numa trajetória estável e duradoura de desenvolvimento. Os riscos
de crises cambiais permanecem,
bem como suas repercussões sobre a
inflação. Não se observam tampouco sinais de que novos investimentos
serão realizados em volume suficiente para enfrentar o desemprego.
Os recentes movimentos do Comitê de Política Monetária (Copom) do
Banco Central, interrompendo o
processo de queda da taxa de juros,
parecem confirmar que o crescimento em 2004 dificilmente ultrapassará
a casa dos 3,5%, marca medíocre dada a baixa base de 2003. A reversão
das expectativas causada pela política do BC de concentrar-se no cumprimento estrito de uma duvidosa
meta de inflação parece estar contaminando negativamente as decisões
de investimento dos empresários.
Não bastassem esses aspectos pouco animadores, são enfáticos os sinais de que novos sobressaltos cambiais estão a caminho, bastando para
isso que os EUA voltem a elevar sua
taxa de juros, atualmente em 1%, o
que deverá provocar a saída de capitais especulativos hoje aplicados em
Bolsa e títulos do governo brasileiro.
Lamentavelmente, ao optar por
"construir credibilidade" abraçando
de forma ortodoxa a agenda dos
mercados financeiros, o governo petista abdicou das mudanças prometidas e tornou-se refém do compromisso assumido. Com isso vão se
frustrando as esperanças de que a
economia possa, enfim, transitar da
lógica financista para a esperada ênfase na produção e no emprego.
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