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ARTE CRUCIFICADA
O Banco do Brasil (BB) errou
ao retirar da mostra "Erótica
-Os Sentidos da Arte" o trabalho da
artista Márcia X (1959-2005) que retratava dois pênis desenhados com
terços religiosos. Ninguém obriga o
BB a patrocinar eventos artísticos,
muito menos exposições polêmicas
como "Erótica", cujo insofismável
teor sexual está anunciado no título.
Entretanto, uma vez que o banco
decidiu lançar-se nessa empreitada,
deve seguir as regras do jogo. E a praxe internacional não poderia estar
mais bem estabelecida. Cabe à instituição financiadora definir o tema da
exposição e designar seu curador. A
partir daí, o responsável indicado,
valendo-se preferencialmente de critérios estéticos, é o único apto a decidir o que entra e o que sai da mostra.
A exclusão do trabalho de Márcia X
se deu à revelia do curador, o que
basta para qualificar a intervenção do
BB como censura.
Católicos que tenham se sentido
ofendidos com o desenho da autora
têm o legítimo direito de protestar e
até mesmo de ameaçar fechar suas
contas na instituição bancária. Trata-se de manifestação não-violenta que
faz parte do jogo democrático. O BB,
contudo, deveria ter resistido à pressão e mantido-se fiel ao compromisso assumido com o meio artístico
quando decidiu patrocinar a mostra.
O banco não pode alegar que desconhecia o caráter polêmico de uma exposição dedicada ao erotismo.
A liberdade de expressão artística,
garantida pelos artigos 5º, IX e 220,
da Constituição, é um dos fundamentos do Estado democrático e
existe justamente para assegurar que
autores possam divulgar idéias ofensivas a parcelas significativas da sociedade. Com efeito, ninguém precisa de autorização legal para dizer o
que todos querem ouvir.
Nesse episódio, a direção do BB
meteu os pés pelas mãos. A um só
tempo, mostrou que não tem apreço
à liberdade artística, sacrifica princípios elevados ao menor sinal de pressão e, pior, não sabe bem o que financia com seus recursos.
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