São Paulo, quarta-feira, 29 de setembro de 2004

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ANTONIO DELFIM NETTO

Vitória na inflação

A despeito de dúvidas e de críticas sobre a política monetária, é inegável que o Brasil fez muito progresso desde a introdução do Plano Real e que mantivemos os ganhos depois da introdução do sistema de "metas inflacionárias". No período, a inflação diminuiu em todo o mundo. Isso se deve certamente ao aperfeiçoamento e à compreensão da necessidade de cooperação entre as políticas monetária e fiscal que os economistas desenvolveram. Nos anos 80, políticas econômicas fiscal e monetária frouxas nos EUA, combinadas com o exercício do poder de monopólio no mercado do petróleo, levaram o mundo à "stagflação": a trágica combinação de recessão com inflação. O gráfico abaixo mostra o que aconteceu com a inflação.




A taxa de inflação média de 180 países na década de 90 foi de 105%, registrando a enorme variabilidade de 346% (a diferença média entre a inflação observada em cada país e a média mundial), ou seja, de 3,3 vezes a média. No período de 2000-2003, a média mundial foi reduzida a 9,6%, e a variabilidade caiu para 26%, ou seja, 2,7 vezes a média.
A taxa de inflação caiu no mundo, mas caiu ainda mais no Brasil. Escapando da indecente média anual de 850% de inflação na década de 90, registramos a média de 8,9% no período 2000-2003. Enquanto a média mundial foi dividida por dez, a média brasileira foi dividida por cem! Não é pouco. Talvez seja essa a maior contribuição da octaetéride de FHC para o Brasil. Pena que ela se vai apagar no tempo à medida que se vão acumulando os terríveis inconvenientes políticos produzidos pela possibilidade de reeleição num país onde poder incumbente não é limitado pelo controle social.
Não esqueçamos que foi a vitória sobre a inflação que permitiu a aventura heterodoxa da reeleição: a melhor árvore, adubada erradamente, produziu o pior fruto...
Temos insistido nas vantagens do sistema de "metas inflacionárias". Quando ele é crível, as "expectativas de inflação" convergem para a "meta" e os agentes (empresários e trabalhadores) têm uma sinalização firme para ajustar salários e preços com plena utilização da capacidade produtiva. Ao Banco Central, cabe manter a liquidez no nível adequado ao máximo da capacidade. É por isso que a credibilidade do Banco Central talvez seja o mais importante lubrificante para evitar os atritos normais na interação dos agentes quando existem diferentes "expectativas inflacionárias" e para substituir os inconvenientes das políticas de "renda".
Com políticas fiscal, monetária e cambial adequadas, o desenvolvimento econômico depende de um Estado aprazível ao "espírito animal" dos empresários. Mas a "meta de inflação" que não restringe esse crescimento depende das medidas microeconômicas que reduzem os atritos no funcionamento da economia. É por isso que a "meta inflacionária" tem de ser fixada judiciosamente e diminuída, monotonicamente, à medida que a política microeconômica lubrifica o funcionamento da economia.

Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

dep.delfimnetto@camara.gov.br


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