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Um passo atrás
Brasil se intromete mais do que deve em Honduras e toma atitude estranha de negar-se ao diálogo com governo de fato
O ENVOLVIMENTO do Brasil na crise hondurenha foi além do razoável, e provavelmente o
Itamaraty já perdeu a capacidade de mediar o impasse. É preciso dar um passo atrás e recuperar a equidistância em relação
seja à intransigência de um governo ilegítimo, seja a uma plataforma, dita bolivariana, descompromissada com a democracia.
O Brasil perdeu o mando sobre
sua embaixada em Tegucigalpa.
A casa está ocupada por cerca de
60 militantes, que acompanham
o presidente deposto, Manuel
Zelaya. Devido à omissão do governo brasileiro, Zelaya e seu séquito transformaram uma representação diplomática estrangeira numa tribuna e num escritório político privilegiados.
O salvo-conduto para o proselitismo chegou ao ápice no sábado. De dentro da embaixada brasileira, Zelaya conclamou a população do país à revolta. Se o
Brasil considera o presidente deposto seu "hóspede", deve impor-lhe a regra fundamental da
hospitalidade diplomática: calar-se sobre temas políticos internos. Do contrário, caracteriza-se intromissão de um país estrangeiro em assuntos domésticos hondurenhos.
A propósito, terá o Itamaraty
controle sobre todos os cidadãos
alojados em sua representação?
Sabe, de cada um, a nacionalidade e o motivo de estar ali? O abrigo deveria restringir-se a Zelaya
e seus familiares próximos; todos os demais precisam ser retirados da embaixada. Não cabe ao
Brasil hospedar a guarda pretoriana do presidente deposto.
Outra posição cada vez mais
estranha do Brasil é a recusa absoluta de negociar com o governo interino de Roberto Micheletti. Tal intransigência contraria a tradição diplomática do Itamaraty, não contribui para a dissolução do impasse e cai como
uma luva para o objetivo do chavismo -interessado em prolongar a desestabilização política
em Honduras.
O presidente Lula negocia com
a ditadura cubana e a favor dela
interveio na Assembleia Geral da
ONU. Em Nova York, afagou o
presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, que acabava de reiterar a negação do Holocausto e
ser flagrado em nova trapaça nuclear. Logo depois, na Venezuela,
Lula se reuniu com golpistas
africanos e ditadores homicidas
do continente, como Robert Mugabe (Zimbábue) e Muammar
Gaddafi (Líbia) -o líder sanguinário do Sudão não pôde comparecer porque poderia ser preso
numa conexão aérea.
O regime chefiado por Roberto
Micheletti em Honduras ocupa
categoria bem mais tênue de ilegitimidade democrática. Violou
a Constituição ao expulsar do
país um presidente eleito, quando a ordem da Corte Suprema
era de prender Zelaya, por afronta a essa mesma Carta. O governo interino, contudo, respeitou a
linha sucessória constitucional,
assegurou o poder em mãos civis
e manteve o calendário das eleições presidenciais, marcadas para 29 de novembro.
O Brasil precisa recobrar a lucidez diplomática -e, com ela, a
sua capacidade de mediação.
Ajudar a dissolver o impasse é a
melhor contribuição que o Itamaraty tem a oferecer no caso de
Honduras.
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