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CRISE E SEGUNDO MANDATO
São tantas as incógnitas na política
e na economia que parece precipitado equacionar uma análise a respeito
das perspectivas para o segundo
mandato de Fernando Henrique Cardoso. Mas tal profusão de dúvidas
por si só deixa transparecer que o
presidente deverá iniciar seu novo
governo reparando avarias e protegendo-se contra novas tempestades.
Em 1995, na sua primeira posse,
FHC dispunha de prestígio, fôlego e
tranquilidade em nível significativamente maior que o de hoje, cacife importante para enfrentar a dura tarefa
de realizar reformas no Estado e na
economia. Agora, além de restarem
ainda muitos desses deveres do primeiro mandato, aliás negligenciados, o governo está diante da nova
maré de problemas impulsionada
pela intriga política, pela fragilidade
de um país que não passou pelas mudanças necessárias e pela instabilidade da economia internacional.
O problema mais recente, o episódio dos grampos e do dossiê Caribe,
pode reservar ainda surpresas desagradáveis; nessa hipótese, haverá
mais consequências para a situação
política do presidente. Não se sabe se
os conspiradores que detonaram tal
crise consideram bastantes os danos
que causaram e se já colheram os benefícios de seus malfeitos. Mas estes
foram suficientes para atingir fortemente o núcleo mais íntimo de assessores da Presidência. Demitiram-se quadros importantes e surgiram fortes rumores de rixas lamentáveis dentro do Planalto. Tal contenda
enfraqueceu o presidente e propiciou
um avanço oportunista dos partidos
de sua coalizão, tendo em vista desde
já a disputa de 2002.
Tais baixas e desavenças devem fazer com que se torne mais difícil para
o governo levar a efeito as correções
de rota necessárias na condução do
país. Mas este parece quase um problema menor, dadas as incertezas da
economia, aqui e alhures.
Espera-se que haja tempo para respirar, agora que é quase certo o acerto com o FMI. Até o pacote fiscal do
governo vai sendo aprovado com velocidade por ora surpreendente. Ao
que parece, a linha de defesa do Real
vai sendo até aqui reconstituída.
Não obstante, assim o país escapa
por enquanto apenas de uma crise
mais aguda. Persistem dúvidas sobre
a estratégia de médio prazo, sobre a
possibilidade de queda rápida dos juros e da viabilidade da política cambial. O Brasil marca passo no enfrentamento de questões emergenciais;
não ataca problemas da estrutura
econômica e social. De resto, o sucesso na inversão da crise terá sempre custo imenso, se não perigoso:
está se falando da recessão e de seus
inevitáveis reflexos sociopolíticos.
Ainda mais angustiante, porém, debelar a crise financeira é uma tarefa
cujo sucesso não depende só de esforços internos. Apesar de a tormenta global ter arrefecido, há grande incerteza sobre a saúde das economias
norte-americana e japonesa. Abalos
no centro mundial da riqueza e do
poder podem levar o país novamente
à quase asfixia financeira.
Não é um cenário de catástrofe, decerto. Há riscos, mas a perspectiva é
mais de dificuldades do que de tragédia. Mas o governo parece hoje sem
luz e força para buscar alternativas à
possibilidade de a correção da crise
se arrastar por dois ou três anos de
morosidade econômica e de estagnação social. Resta a esperança de que,
amainada a tormenta, o governo encontre energia e coragem para impedir a luta intestina de sua coalizão e
ouse dar novo rumo à economia.
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