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FERNANDO GABEIRA
Outro mundo
RIO DE JANEIRO - Quando estava preso, Affonso Romano me visitou e disse que achava que nossa visão revolucionária tinha muito de
religioso. Naquele momento, estranhei. Mais tarde, lendo a conferência de George Steiner, "Os Sonhadores do Absoluto", percebi que havia afinidades. Sobretudo nessa certeza em determinar o sentido do
homem, em sonhar com um mundo
completamente novo, inclusive
com um homem novo.
No meio da década de 60, no bar
Degrau, disse para Bolívar Lamounier que, como Sartre, achava o
marxismo o horizonte intelectual
insuperável de nosso século. "Bobagem do Sartre", respondeu diante
do copo de chope. Também estranhei. Sartre era o filósofo.
Tinha muitas reações de estranheza diante dos livros de Isaiah
Berlin. Ele escreveu numa revista
"Encounter" financiada pelo governo americano. Era considerado da
CIA. A qualidade de sua obra me
conquistou. Além de entender a Revolução Russa, achou bem no romantismo alemão as raízes revolucionárias. Homem novo? Sentido
da história? Todas essas grandes
ideias passam por sua análise fria,
liquidificadora.
Leio agora sobre a Europa. Deu
um grande salto no pós-Guerra. Um
a um, os partidos social-democratas se livraram das certezas da história, contentando-se com o aumento do poder de consumo, a
maior liberdade das pessoas, uma
estabilidade democrática. Vista retrospectivamente, foi uma extraordinária conquista.
Nesse momento de crise, em vez
de outro mundo, peço um mundo
melhor. É o caminho para abordar a
economia e a degradação ambiental. Uma vez foi tentada uma conferência entre os dois fóruns, Davos e
Porto Alegre. Um caos. Cada um falava a sua língua. Não conseguiram
se entender. Se houver outro mundo, ou, mais modestamente, um
mundo melhor, dependerá mesmo
de fóruns como esses?
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