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CLÓVIS ROSSI
A fábrica da desigualdade
SÃO PAULO - Perdoe o leitor se
insisto no tema da desigualdade.
Mas, se o presidente Lula pôde dizer uma vez que, qualquer dia, alguém o apontaria como "o chato do
etanol", de tanto que fala no assunto, não me incomoda tornar-me "o
chato da desigualdade".
É, afinal, a maior chaga aberta na
pátria. Chaga que tem sido escamoteada pela lenda de sua queda, baseada em pesquisas que apontam
apenas a diminuição da desigualdade entre salários, não entre rendimentos do capital e do trabalho
-essa sim a grande diferença.
Para piorar ainda mais as coisas,
há o fato de que a desigualdade é
não apenas de renda mas também
de oportunidades, de que dá contundente prova o resultado do Exame Nacional do Ensino Médio.
Aceitando o precioso ensinamento contido na análise de Antônio
Gois na Folha de ontem, nem vou
falar da abissal diferença de desempenho entre escolas públicas e privadas, velha conhecida.
O ponto principal, exposto por
Gois e também por Reynaldo Fernandes, responsável pelo Inep, o
instituto que faz o exame, é este:
"Nenhuma prova mede só a qualidade da escola. Mede a do aluno, a
formação dos pais e o contexto socioeconômico", como diz Reynaldo
Fernandes.
Tradução: filho de família pobre
vai para escola pobre (no sentido de
qualidade de ensino), filho de rico,
para escolas mais equipadas. Consequência inexorável: o filho do rico tem mais possibilidades, também pela educação, de continuar rico ou ficar mais rico, enquanto ao
filho do pobre o que se oferece é
uma grande chance de perpetuação
da pobreza -e, por extensão, da desigualdade com o concorrente rico.
Fecha o círculo a afirmação de
Fernandes de que "esse resultado
se repete ano a ano", coisa, de resto,
que todos estamos cansados de saber. Traduzindo: ano a ano, mantemos o molde da desigualdade.
crossi@uol.com.br
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