São Paulo, terça-feira, 30 de junho de 2009

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Pandemia de gripe: desafios no atendimento

CARLOS FREDERICO DANTAS ANJOS


Gostaria de levantar alguns aspectos de importância em saúde pública que dizem respeito ao atendimento hospitalar de pacientes

DESDE 24/4 , quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) notificou os países-membros da ocorrência de casos humanos de influenza A (H1N1) no México e, posteriormente, nos EUA, considerando o fato uma emergência em saúde pública, o Ministério da Saúde (MS) e as secretarias estaduais da Saúde adotaram as medidas necessárias para enfrentar essa pandemia.
Em nível local, unidades como o Instituto de Infectologia Emílio Ribas (IIER) imediatamente passaram a atender os primeiros casos já aplicando o plano de contingência, anteriormente elaborado a partir das orientações e dos planos de contingência federal e estadual elaborados quando da ameaça da gripe aviária.
Hoje, o IIER é o principal hospital de referência para o atendimento dos pacientes com suspeita da gripe A na cidade de São Paulo, mais uma vez mantendo sua história, tradição e excelência institucional e dos seus profissionais no enfrentamento das epidemias em nosso país.
Neste artigo, gostaria de levantar alguns aspectos de importância em saúde pública que dizem respeito ao atendimento hospitalar de pacientes com suspeita da nova gripe.
Na última semana, triplicou o número de suspeitos atendidos na unidade de emergência (PS) do IIER, coincidindo com o aumento dos casos confirmados até 27/6 no Brasil (591) e no Estado de São Paulo (294), início das férias escolares e do inverno e aumento de fluxo de viagens para países com transmissão sustentada (Argentina, EUA, Canadá, México e Chile).
Como hospital especializado em doenças infecciosas, é até natural que os pacientes se dirijam para atendimento no IIER. Acontece que o IIER é 1 dos 5 hospitais na grande São Paulo que são referência para o atendimento desses pacientes, ao lado do Hospital das Clínicas, hospital São Paulo-Unifesp, hospital do Grajaú, Hospital Geral de Guarulhos e hospital Mário Covas-Santo André.
Com a expansão da pandemia no país e no Estado de São Paulo (quase 50% do total de casos), é urgente que a Secretaria Estadual da Saúde adote medidas no sentido de orientar o atendimento desses pacientes em outros hospitais públicos da rede estadual, municipal e, inclusive, da rede privada de saúde, reservando os hospitais de referência, preferencialmente, para o atendimento aos casos de maior gravidade ou para grupos de risco que podem desenvolver doença grave, como idosos, crianças, gestantes, portadores de imunodeficiências e outras doenças crônicas, como diabetes, cardiopatas e renais crônicos.
Não há dificuldades maiores do ponto de vista operacional, tanto para a rede pública quanto para a rede privada ou para a conveniada de saúde, pois os protocolos de manejo epidemiológico, clínico, laboratorial e de tratamento estão facilmente disponíveis nos planos de enfrentamento da influenza nos sites do ministério e da Secretaria Estadual da Saúde.
Por outro lado, o perfil clínico e epidemiológico da gripe suína se caracteriza por acometer jovens e com baixa letalidade (em média, 0,4% dos casos). No Brasil, onde mais de 70% dos casos são importados, 85% têm entre 10 e 49 anos, mais de 90% dos quais com quadros clínicos leves e moderados (Sinam/MS). Nos EUA, só 9% dos casos requereram hospitalização, 41% destes portadores de doenças crônicas (NEJM, 2009).
Se pelo aspecto de morbimortalidade essa epidemia assemelha-se aos casos de gripe comum (influenza sazonal), limitados, não complicados, exceto pelo aparecimento de diarreia e vômitos, do ponto de vista epidemiológico preocupa-nos pela característica de rápida propagação e sustentada transmissão entre humanos, fato ainda não ocorrido no Brasil.
Chamo a atenção para o fato de que mesmo os casos mais graves são similares a pessoas infectadas com outros vírus de origem suína ou influenza sazonal, cuja morbimortalidade associada resulta de complicações secundárias, como pneumonia viral e bacteriana secundária ou como exacerbação de doença crônica.
Duas características marcaram essa pandemia: a rápida propagação, pela facilidade de deslocamento das pessoas, e a possibilidade de rápida resposta, por meio de uma grande rede de informações de vigilância, controle e diagnóstico rápido.
Destacamos também a eficiência das ações dos órgãos de saúde, tanto na proteção individual e dos profissionais de saúde, com medidas simples, como uso de máscaras, luvas e lavagem das mãos, quanto na proteção da comunidade, com medidas de controle de portos, aeroportos e fronteiras, seguimento de contatos e quarentena, sempre visando à redução do risco de infecção e transmissão.
Enquanto isso, esperamos que uma vacina eficaz seja logo desenvolvida e possa ser aplicada com segurança em benefício da humanidade.


CARLOS FREDERICO DANTAS ANJOS , 53, é médico, doutorando em medicina de urgência pela Faculdade de Medicina da USP e ex-diretor clínico do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


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