São Paulo, quinta-feira, 30 de agosto de 2007

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A fase das provas

STF se dispõe a acelerar o processo do mensalão; cabe à Procuradoria Geral reforçar as evidências com vistas à condenação

ACEITA a denúncia do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e aberta a ação criminal contra os 40 acusados pela Procuradoria Geral da República, tem início a fase trabalhosa e delicada do processo que galvaniza o país. A mais imediata preocupação decorre da própria complexidade da organização sob julgamento. Quatro dezenas de réus estão habilitados a arrolar várias testemunhas, cujo número arrisca ultrapassar três centenas. Se a oitiva não for ágil, podem vencer antes os prazos de prescrição, pondo por água abaixo todo o trabalho já realizado.
O Supremo, felizmente, manifestou estar atento a tal possibilidade. O ministro relator, Joaquim Barbosa, anunciou que a tomada de depoimentos poderá ocorrer por intermédio de juízes federais nos Estados. Depreende-se daí sua disposição de, além de fazer justiça com apuro técnico, igualmente administrá-la no tempo devido.
Em paralelo, o STF também sancionou medida a respeito dos chamados embargos declaratórios, recursos facultados à defesa para esclarecer pontos tidos como obscuros e que podem ser cruciais para retardar uma ação penal. Ao decidir que a apreciação dos embargos não impedirá o prosseguimento de interrogatórios dos réus, os ministros evidenciaram o ânimo de concluir a instrução do processo tão cedo quanto possível. Apesar disso, existe a expectativa de que ele se prolongue por mais de dois anos.
Nesta nova fase, volta a ser decisivo o papel da Procuradoria Geral. Por ora os ministros do Supremo acataram, até com elogios, a maioria dos argumentos relacionados na denúncia formulada pelo procurador-geral Antonio Fernando de Souza. De outro lado, sinalizaram que compete ao Ministério Público Federal fortalecer as acusações com novas provas. Nem tudo que foi aceito como indício para abertura do processo o será como base para futuras condenações.
Não se trata de incumbência trivial, pois o fluxo de dinheiro no cerne do mensalão é notoriamente difícil de rastrear e reconstituir, mais ainda de documentar. Coincidências de datas e valores de saques e depósitos, por exemplo, necessitam de ampla regularidade para caracterizar padrão aceitável como evidência. As sucessivas movimentações de quantias pelo valerioduto tinham precisamente o propósito de dificultar o rastreamento, e só com dedicação e minúcia superiores às da organização podem os investigadores incriminá-la de modo irrefutável.
No que toca à acusação de formação de quadrilha, que previsível e finalmente enredou figuras de primeira grandeza do petismo e do governo Lula, parece óbvio que só há perspectiva de obter novas provas testemunhais. Afora uns poucos "aloprados", a ninguém ocorreria isentar de responsabilidade política chefes do calibre de José Dirceu. Mas demonstrar de modo irrefutável os elos da cadeia de comando que os ligam aos operadores materiais dos delitos do mensalão, de maneira a instruir uma eventual condenação, constitui o novo desafio diante do procurador-geral.


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