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IGOR GIELOW
Um Sudão
BRASÍLIA - Um Sudão é o que nós vemos nas fazendas do interior mineiro, onde o lulista de carteirinha (até
2010, ao menos) Aécio Neves diz que
não há trabalho escravo. Quem sabe,
vá lá, "condições degradantes". Fazendo justiça à nação africana, lá as
condições terríveis de vida são resultantes de uma guerra civil endêmica
entre o norte árabe-islâmico e o sul
negro-cristão-animista. Mas, na ponta, o resultado é quase o mesmo. Gente miserável, soluções a bala.
Um PIB do Sudão também é o que
o governo pagou de juros no ano passado: R$ 145,2 bilhões, pouco mais do
que o maior país africano produziu
de riqueza em 2002. Ou ainda um
PIB da Guatemala, ou um da Bulgária, ou a soma do que produziram os
vizinhos Uruguai e Bolívia. Ou dois
PIBs de Cuba, para ficar numa predileção do presidente. Ou 3.247.004.797
DVDs do Zeca Pagodinho, outro símbolo da Era Lula, num site que vende
música e cinema brasileiros para
gringos -em dólar.
Mas jogos matemáticos, como quase tudo que envolve número, resvalam na cretinice. Não é o caso. Estamos falando de gente que morreu
trabalhando. Se amanhã descobrirem que foi um crime comum, hipótese altamente improvável, isso não
muda nada para as vítimas. Nem para a situação no campo, onde 42 pessoas morreram em conflitos em 2003.
Enquanto vivia-se a tal bolha do
otimismo do começo do ano, nada
disso parecia incomodar o sorriso de
aeromoça das autoridades. Afinal, o
país vai crescer em 2004, o Brasil vai
fazer e acontecer. Pode ser. Na verdade, tudo indicava que sim. Tomara,
para o bem de todos. Mas, se essa
gente anunciasse que El-Rei Dom Sebastião iria voltar em março, era capaz de isso virar verdade a ser martelada por colunistas e colunáveis.
Agora, que a bolha dá sinais de que
o ano pode não ser assim aquela maravilha, vêm os vislumbres de um outro Brasil. De um país onde fiscais do
Trabalho morrem tentando controlar práticas escravocratas. De um
país que paga o PIB sudanês de juros.
De um país que não dá certo.
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