São Paulo, sábado, 31 de março de 2007

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Buraco negro

Metrô de SP demora a esclarecer quando obra da linha 4 continuará com segurança; governo deve exigir mais transparência

SINGULARIDADES como os buracos negros, em cosmologia, descrevem objetos tão maciços que seu campo gravitacional atrai tudo para dentro de si, até a própria luz. A imagem pode não ser perfeita para descrever a cratera aberta na obra da linha 4 do metrô paulistano, há dois meses e 19 dias, mas resume bem a carência singular de informações esclarecedoras sobre a segurança da obra, desde então.
Pereceram no desastre sete pessoas. Apesar da gravidade do acidente, até ontem nenhum perito havia descido ao local do desabamento, no interior da cratera, para iniciar as observações diretas necessárias para enfim estabelecer suas causas. Ministério Público e IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) exigem, compreensivelmente, garantia de estabilidade do terreno para que sejam iniciadas.
É evidente que o trabalho de estabilização deve tomar o tempo que for necessário, sem pressa que rebaixe níveis de segurança. Por outro lado, não há clareza -fora dos gabinetes da Companhia do Metrô e do consórcio construtor Via Amarela, ao menos- sobre prazos envolvidos, nem tampouco acerca de estarem sendo cumpridos ou não.
Pior: a incerteza contaminou as obras como um todo. Várias das 23 frentes de trabalho da linha 4 foram paralisadas um mês depois da tragédia, quando surgiram dúvidas sobre a qualidade de soldas realizadas na estrutura metálica da estação Fradique Coutinho. Milhares de pessoas que moram e circulam sobre os canteiros subterrâneos, da Vila Sônia à Luz, têm pleno direito a informações confiáveis, mas são mantidas na penumbra, assim como o restante da população.
Nas tratativas do consórcio e do Metrô com o Ministério Público ficou acordado que o primeiro contrataria laudos de terceiros sobre a segurança nas várias frentes da obra, que seriam então avaliados pelo IPT. Como noticiou ontem esta Folha, os quatro primeiros pareceres ficaram prontos nesta semana, sem no entanto ganhar publicidade de pronto, como seria desejável.
O IPT alega que, como contratado, as informações não lhe pertencem, mas sim a seu cliente (o consórcio). Nem este nem o Ministério Público divulgaram os pareceres de imediato. O Metrô se limitou a publicar nota lacônica, na qual afirma que "os relatórios estabelecem a necessidade de demonstração de uma série de providências relacionadas com a segurança da obra" -o que não chega a ser esclarecedor.
Sob pressão da imprensa, convocou-se afinal sessão de informação por um diretor do Metrô (a perspectiva, sabe-se agora, é retomar obras nas próximas semanas). Está mais do que na hora, porém, de começar a fazer isso regular e espontaneamente, sob pena de medrar na esfera pública a desconfiança de que algo não possa ser explicado ou, pior, necessite ser ocultado.


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