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Buraco negro
Metrô de SP demora a esclarecer quando obra da linha 4 continuará com segurança; governo deve exigir mais transparência
SINGULARIDADES como os
buracos negros, em cosmologia, descrevem objetos tão maciços que seu
campo gravitacional atrai tudo
para dentro de si, até a própria
luz. A imagem pode não ser perfeita para descrever a cratera
aberta na obra da linha 4 do metrô paulistano, há dois meses e 19
dias, mas resume bem a carência
singular de informações esclarecedoras sobre a segurança da
obra, desde então.
Pereceram no desastre sete
pessoas. Apesar da gravidade do
acidente, até ontem nenhum perito havia descido ao local do desabamento, no interior da cratera, para iniciar as observações diretas necessárias para enfim estabelecer suas causas. Ministério
Público e IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) exigem,
compreensivelmente, garantia
de estabilidade do terreno para
que sejam iniciadas.
É evidente que o trabalho de
estabilização deve tomar o tempo que for necessário, sem pressa que rebaixe níveis de segurança. Por outro lado, não há clareza
-fora dos gabinetes da Companhia do Metrô e do consórcio
construtor Via Amarela, ao menos- sobre prazos envolvidos,
nem tampouco acerca de estarem sendo cumpridos ou não.
Pior: a incerteza contaminou
as obras como um todo. Várias
das 23 frentes de trabalho da linha 4 foram paralisadas um mês
depois da tragédia, quando surgiram dúvidas sobre a qualidade de
soldas realizadas na estrutura
metálica da estação Fradique
Coutinho. Milhares de pessoas
que moram e circulam sobre os
canteiros subterrâneos, da Vila
Sônia à Luz, têm pleno direito a
informações confiáveis, mas são
mantidas na penumbra, assim
como o restante da população.
Nas tratativas do consórcio e
do Metrô com o Ministério Público ficou acordado que o primeiro contrataria laudos de terceiros sobre a segurança nas várias frentes da obra, que seriam
então avaliados pelo IPT. Como
noticiou ontem esta Folha, os
quatro primeiros pareceres ficaram prontos nesta semana, sem
no entanto ganhar publicidade
de pronto, como seria desejável.
O IPT alega que, como contratado, as informações não lhe
pertencem, mas sim a seu cliente (o consórcio). Nem este nem o
Ministério Público divulgaram
os pareceres de imediato. O Metrô se limitou a publicar nota lacônica, na qual afirma que "os
relatórios estabelecem a necessidade de demonstração de uma
série de providências relacionadas com a segurança da obra" -o
que não chega a ser esclarecedor.
Sob pressão da imprensa, convocou-se afinal sessão de informação por um diretor do Metrô
(a perspectiva, sabe-se agora, é
retomar obras nas próximas semanas). Está mais do que na hora, porém, de começar a fazer isso regular e espontaneamente,
sob pena de medrar na esfera
pública a desconfiança de que algo não possa ser explicado ou,
pior, necessite ser ocultado.
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