São Paulo, sábado, 31 de maio de 2008

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GUSTAVO FRANCO

Nota cinco

NÃO SÃO muitos os que sabem explicar exatamente o que é o "grau de investimento", a grande notícia desta semana. Mas a idéia geral é simples, como as certificações de qualidade, começando por ISO e seguidas por um número, geralmente aplicadas para produtos industriais.
É claro que um consumidor indefeso, diante de um ferro de passar roupa ISO 9.000, pode ficar impressionado com o selo, mas vai ficar indeciso diante de outro produto com um selo ISO 8.000, de outra cor e mais caro.
Quando se trata da certificação da qualidade do crédito de um país, ou mais precisamente do risco soberano, o que se pode dizer de forma muito simples sobre as escalas é que, como as notas no colégio, vão de zero a dez, em intervalos de meio ponto. E, também como no ginásio, as notas iguais ou maiores que cinco são designadas como "grau de investimento".
Para duas das três principais agências certificadoras ou classificadoras de crédito no mundo, o Brasil é nota cinco. Para a terceira, a Moody's, estamos ainda com um esforçado quatro e meio.
Há muito significado na nota cinco, que é a mínima exigida em muitos estatutos de investidores institucionais, de modo que ganhar um cinco é semelhante a passar de ano, motivo de festa para um país que esteve em estado crônico de reprovação há décadas. Todavia, o alívio deve ser comedido, pois, na realidade, o menino passou raspando, e a nota não é boa e está muito abaixo do potencial de aprendizado da criança.
Por isso mesmo os pais não devem pensar que a vida ficou mais fácil, pelo contrário. Ao passar de ano, o menino vai ver matéria nova, bem mais difícil. O grau de exigência ficou maior, como bem sabe o América de Natal, que, no ano retrasado, ganhou com méritos o direito de jogar na primeira divisão do futebol brasileiro, mas teve dificuldade em se equilibrar na nova condição.
A lição do América de Natal, hoje rebaixado, deve ser muito útil para o ministro da Fazenda e para o governo em geral, que devem investir nos atributos que são próprios dos clubes grandes, e que as agências elogiaram, e não nos conceitos e idéias que as agências criticaram abertamente, como esse keynesianismo paraguaio que às vezes assoma o governo quando se trata de despesa e, mais especificamente, como algumas piruetas como o Fundo Soberano e a nova CPMF.
A melhor coisa do "grau de investimento" é deixar claro que idéias alternativas e esotéricas no domínio da política econômica ficaram para trás e não cabem mais na nossa classificação de crédito. Mais um prego no caixão das heterodoxias.


gh.franco@uol.com.br

GUSTAVO FRANCO
escreve aos sábados nesta coluna.


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