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A voz rouca das ruas
FERNANDO RODRIGUES
Brasília - Não existe movimento de
massa totalmente espontâneo. Aprendi isso na adolescência, quando era
trotskista.
Acredito nessa máxima até hoje. Por
isso, desconfio dessa greve de caminhoneiros que aparentemente teria
surgido do nada.
Minha impressão é que esse movimento que parou o país só é mais um
passo de uma tendência, lenta e gradual, de sofisticação dos anseios da sociedade brasileira. Sábia, a população
busca caminhos não convencionais
para manifestar o seu sentimento de
protesto.
Partidos políticos e sindicatos, no
formato atual, estão sendo deixados
para trás pelos brasileiros.
Às vezes dá certo. Outras vezes, não.
Por exemplo, em 89 a população empurrou para debaixo do tapete Ulysses
Guimarães, Aureliano Chaves, Paulo
Maluf e Mário Covas, para citar só
quatro, e elegeu Fernando Collor presidente -uma pessoa que não tinha
nenhum vínculo orgânico com nada.
Deu no que deu.
A culpa não é da população. Como
não foi agora dos caminhoneiros. A
população age de acordo com as informações de que dispõe. Pode seguir pelo melhor ou pelo pior caminho. Cabe
a quem tem o controle do Estado fazer
o possível para fornecer os meios para
que a democracia seja exercida corretamente.
No governo FHC, foi zero o esforço
para aperfeiçoar as instituições que
garantem a democracia. O próprio
presidente já jogou uma pá de cal na
reforma política, a mais necessária, ao
dizer que isso não é prioridade dos governistas no Congresso.
Como nada garante que a economia
vá melhorar a ponto de acalmar os
ânimos da metade mais miserável dos
brasileiros, tudo indica que a greve dos
caminhoneiros tenha sido apenas um
de muitos movimentos "espontâneos"
que o país verá nos próximos meses.
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