São Paulo, domingo, 31 de outubro de 2004

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Movido a esperança

JOSÉ SERRA

Depois de tantos anos de militância e de eleições disputadas, é gratificante constatar o entusiasmo que esta campanha na cidade de São Paulo despertou. Foram quatro meses sem parar percorrendo a cidade imensa. Quatro meses de contato intenso, direto, caloroso com as pessoas. Vem delas, do povo, a energia que eu sinto, como se essa longa jornada estivesse apenas começando. Tomara que esteja começando de fato.
O programa de governo que divulguei no fim do primeiro turno, incorporando as contribuições de centenas de pessoas, aponta os caminhos para a cidade se vier a ser seu prefeito nos próximos quatro anos. Está no site da minha campanha (www.serra45.org.br).
Depois destes meses ouvindo os paulistanos, dos maiores especialistas à gente nas ruas, tenho certeza de uma coisa: recursos e boas idéias não faltam para dar o salto de qualidade que há anos nossa cidade precisa e espera. Têm faltado -e isso é o que eu espero levar para a prefeitura- planejamento, prioridades, capacidade de usar bem os recursos e tirar as boas idéias do papel.
A condição fundamental para fazer isso é respeitar a cidade, mostrando respeito pelos valores republicanos que seus moradores querem ver prestigiados. Entender, antes de mais nada, que a prefeitura não é propriedade de um partido político ou de grupos. Que o prefeito e cada um de seus colaboradores estão lá para servir ao público, a todos os cidadãos, não a si mesmos nem a seus amigos e companheiros. Governar São Paulo com espírito republicano implica reconhecer que o tamanho e a complexidade dos problemas da cidade são incompatíveis com a improvisação. Exigem, em primeiro lugar, planejamento: continuidade das ações e inovações tecnicamente consistentes, bem projetadas e executadas, dentro da indispensável articulação com os municípios da macrorregião e com o governo do Estado.
Em segundo lugar, administrar bem a cidade requer prioridades claras. Quando tudo é prioridade na teoria, nada é prioridade na prática; os recursos se fragmentam, os resultados não aparecem e alguns setores são prejudicados, como aconteceu com a saúde na cidade. Hierarquizar as demandas é essencial para empregar bem o dinheiro público.
Em terceiro lugar, quando o governo precisa se financiar, sem criar impostos e sem ir a mercado porque há limites legais de endividamento, a opção correta é a parceria, tanto com os governos estadual e federal quanto com a sociedade, ONGs, igrejas, iniciativa privada. Para ser um bom parceiro, a prefeitura tem de evitar a manipulação e tornar claras as regras do jogo. Além de as cumprir.
Em quarto lugar, a difícil situação financeira da prefeitura vai exigir muita parcimônia nos gastos. Há muita gordura para cortar. É preciso acabar com o desperdício e o sobrefaturamento generalizados, seja por duplicação de atividades, seja por tarefas mal feitas ou feitas às pressas, seja devido a outros interesses menos conspícuos. Nessa matéria, aliás, a atual prefeitura do PT (ao contrário da de Luiza Erundina) nada ficou devendo às de Pitta e Maluf.
Por fim, fazer a prefeitura funcionar direito implica trabalhar pelas prioridades da cidade o tempo todo, desde o primeiro dia e da primeira hora do mandato do prefeito. A experiência da atual gestão mostra que a estratégia de só trabalhar no último ano não funciona, pois posterga o atendimento das necessidades essenciais, faz obras de improviso, mal feitas, como os túneis e a Radial Leste, e mais caras. Funcionar direito implica também , antes de inventar projetos mirabolantes, fazer funcionar melhor tudo o que já existe. Extrair o máximo rendimento e eficiência dos equipamentos instalados é o que faz um prefeito que trabalha desde a primeira hora, e não em função do calendário eleitoral.
A grande tarefa de um prefeito é cuidar do bem-estar das pessoas. Sem o partidarismo nem a politicagem que levam à dilapidação dos recursos públicos. Sem o paternalismo que tenta transformar em dádiva o que é direito dos cidadãos. São Paulo tem prioridades urgentes. As pessoas -as mães, as crianças, os jovens, os enfermos, os idosos, os desempregados, as famílias preocupadas com a violência, os paulistanos que perdem horas no trânsito todos os dias- não podem esperar. Elas exigem cidadania já. É para responder a essa exigência que a prefeitura deve trabalhar em primeiro lugar.
Ao mesmo tempo, para se firmar na posição de capital empresarial e cultural da América do Sul, São Paulo precisa de uma estratégia de desenvolvimento que reforce os atrativos e atenue os problemas que podem afastar dela os centros de decisão das grandes empresas e os produtores de cultura.
Além de um gestor competente dos serviços essenciais, o prefeito deve ser o coordenador dos grandes projetos estruturantes que vão definir a cara de São Paulo dentro de dez, 20 anos e um articulador das alianças necessárias para dar continuidade a esses projetos. Articulador da parceria com o governo do Estado, em especial, indispensável para equacionar os problemas da cidade na escala da região metropolitana.
Essas são as bases do meu compromisso com São Paulo. A luta que vejo pela frente não termina no dia da eleição. Recomeça ali, se assim decidirem as urnas. Escrevo este artigo imbuído do sentimento de esperança que colhi nos apertos de mãos, nos abraços e nos olhos das pessoas nas ruas, nos bairros mais distantes da nossa cidade. Sinto que preciso, que tenho o dever de voltar lá com boas notícias. Gostaria de fazê-lo como prefeito.


José Serra, 62, é o candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo. Foi senador pelo PSDB-SP (1995-2002) e ministro do Planejamento e da Saúde (governo Fernando Henrique).

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