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ANTONIO DELFIM NETTO
Fato consumado
A DISCUSSÃO sobre a CPMF
mostra o eterno oportunismo que domina a cena política brasileira. Enquanto para o
PSDB e o velho PFL, que, quando
no governo, criaram-na como a
"solução para os problemas da saúde", para o PT, então na oposição,
ela era o "pior imposto já imaginado"! A CPMF é uma excrescência
num sistema tributário inteligente
e bem construído. Ela foi criada
não porque o Congresso confiasse
no governo e no bom uso que faria
do tributo, mas quase como uma
homenagem à reconhecida competência do doutor Adib Jatene. Sobre ele se depositaram naquele
momento as esperanças de uma
solução para o gravíssimo problema da saúde. Usado e abusado, demitiu-se, não sem antes ter sido vítima de toda a sorte de "mágicas"
em que são especialistas os ministérios da Fazenda e do Orçamento.
Agora as posições são opostas: o
PT, hoje no governo, defende com
unhas e dentes as "virtudes" da
CPMF e, marotamente, chama a
atenção dos "pobres" para o seu
"efeito denúncia" contra os "ricos",
enquanto garante que sem ela todo
o programa social do governo vai
para o brejo... E o PSDB e o Democratas (o novo PFL), que a criaram
e defenderam com unhas e dentes
quando no governo, hoje lhe atribuem todos os defeitos (até os que
não tem), exigindo a sua extinção.
A Contribuição Provisória sobre a
Movimentação Financeira foi criada em 1º de janeiro de 1993 para
terminar em 1º janeiro de 1995,
mas foi prorrogada sistematicamente (por reformas constitucionais) até 31 de dezembro de 2007.
Em 1993, a alíquota era de 0,20%.
Hoje é quase o dobro, 0,38%, e sua
arrecadação representa em torno
de 1,42% do PIB. O que se pede,
agora, é mais uma prorrogação
"provisória"...
A simples cronologia mostra que
nenhum dos lados deve ser levado
a sério. Nem FHC nem Lula podem
ser desculpados pela facilidade
com que ilidiram o dispositivo
constitucional. Este determinava
que o governo se preparasse em
1994 e 1995 para apresentar o Orçamento de 1996 sem a receita da
CPMF. Reeleito, FHC prorrogou-a. Lula sabia, desde 2003 (quando
foi eleito), que ela era "provisória".
Deveria terminar em 2007 e, portanto, os Orçamentos deveriam ter
sido preparados ao longo de quatro
anos para eliminá-la da receita da
União em 2008. E, no entanto, a
peça orçamentária (depois da reeleição de Lula) foi remetida ao
Congresso com uma receita (a da
CPMF) que, a rigor, ainda não
existe!
A cínica discussão que ignora esses fatos, entre governo e oposição,
mostra apenas a falta de pudor da
política nacional, que vive e sobrevive do fato consumado, mas não
prova que hoje a CPMF seja dispensável.
contatodelfimnetto@uol.com.br
ANTONIO DELFIM NETTO escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
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