São Paulo, quarta-feira, 31 de outubro de 2007

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Fidelidade partidária e democracia

PAULO MALUF

Os próprios partidos políticos só conseguirão se desenvolver e ficar fortes por meio da prática da fidelidade partidária

A DECISÃO do Supremo Tribunal Federal sobre a obrigatoriedade da fidelidade partidária e as decisões regulamentadoras do Tribunal Superior Eleitoral sobre o mesmo assunto recolocam os partidos políticos do Brasil no lugar que sempre deveria ser o deles. É sempre assim nas democracias.
Um país com partidos políticos fortes, com conteúdo programático claro e visível, é o melhor suporte para a democracia se amparar e ficar cada vez mais sólida e permanente.
Dentro dos partidos políticos é que se formam homens públicos que têm a responsabilidade de melhorar a vida das pessoas. É também dentro dos partidos políticos que se desenvolvem o pluralismo, a discussão de idéias e de caminhos melhores para a solução dos problemas sociais.
Os próprios partidos políticos só conseguirão se desenvolver e ficar fortes por meio da prática da fidelidade partidária, pois é ela que garantirá que aqueles que militam em cada agremiação política sigam os preceitos que cada programa partidário determina a seus filiados.
Como é possível, para ficarmos num exemplo só, que 156 prefeitos em todo o Brasil tenham trocado de partido, mesmo depois da decisão de março deste ano, do TSE, de que a fidelidade partidária estava restabelecida? E que, de 2004 até agora, 431 entre os 5.562 prefeitos eleitos tenham optado pela troca de partido?
Há 40 anos estou na vida política e sempre fui um homem público de um único partido. Aprendi a fazer política dentro de meu partido e acredito que o grande número de votos próprios que possuo advenha em muito dessa fidelidade àquilo que meu partido preceitua.
Partido político não é um balcão de negócios para que seus militantes possam usar como moeda de troca, ao sabor dos interesses, não dos partidos e do país, mas daqueles que trocam o cargo eletivo que possuem ao sabor de conveniências pessoais sempre suspeitas.
A fidelidade partidária acabou em 1984, acho que por minha causa, como um dos motivos para impedir minha vitória no colégio eleitoral que iria eleger o presidente da República.
Em 6 de novembro de 1984, respondendo a uma consulta do deputado Gerardo Renault (PDS-MG), o TSE decidiu que os membros do então colégio eleitoral ficariam desobrigados do compromisso da fidelidade partidária. O próprio ministro-chefe da Casa Civil do governo de João Baptista Figueiredo, Leitão de Abreu, opinou ser favorável ao fim da fidelidade partidária para ajudar o TSE a decretar a medida.
Vários pedidos encaminhados ao TSE tentaram impedir a validade da decisão de acabar com a fidelidade partidária. Em vão.
No dia 4 de dezembro daquele ano, o Tribunal Superior Eleitoral julgou a medida definitiva; estava assim terminada no Brasil a fidelidade dos eleitos a seus partidos políticos. Nem por isso abandonei a disputa e fui até o fim do processo eletivo, que foi uma forma de dar legitimidade à eleição que se disputava.
Sem a minha presença, me disseram muitos, poderia haver tentativa de uma saída não institucional para a eleição, com a intervenção de quem poderia defender que a participação de candidato único não seria legitima.
Na democracia perene em que agora estamos, a fidelidade partidária é muito mais importante que naquele episódio sobre o qual acabo de falar.
Pois é a democracia, fortalecida por partidos políticos fortes e transparentes, que assegura ao Brasil a vida democrática e impedirá a volta de qualquer regime de exceção.
Para nossa felicidade, foi a própria Justiça, no Tribunal Superior Eleitoral, presidido pelo ilustre ministro Marco Aurélio Mello, a responsável pela volta da fidelidade partidária.
O uso da famosa frase de Winston Churchill, "democracia não é a melhor forma de governo que existe, só que não há outra mais perfeita", já virou até clichê. Mas, de certa forma, a perenidade da frase é o melhor exemplo de que o caminho democrático é o melhor para ser trilhado.
É dentro dos partidos políticos que se aprende esse caminhar. Com disciplina, idealismo, adesão a causas nobres e praticando o ideal democrático para que o Brasil encontre rapidamente o acelerado crescimento com justiça social.


PAULO SALIM MALUF, 75, engenheiro, é deputado federal pelo PP-SP. Foi governador de São Paulo (1979-1982) e prefeito da cidade de São Paulo (1969-1971, 1993-1996).

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