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Editoriais
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Solução americana
Ao costurar acordo em
Honduras, EUA ressaltam
limitações do governo
Lula para assumir novas
tarefas na América Latina
PARA UM país como os EUA,
envolvido em graves problemas internacionais, como a estabilização do Iraque e do
Afeganistão, era natural que a
opereta de Honduras não despertasse grande preocupação. A
expulsão do país do presidente
Manuel Zelaya, de pijamas, foi
sem dúvida um gesto violento e
inaceitável, a merecer repúdio.
Ali os militares extrapolaram
uma ordem da Suprema Corte,
que determinava a prisão de Zelaya por suas manobras para
atropelar a Constituição.
Um compreensível e elogiável
clamor contra a arbitrariedade,
liderado por governos latino-americanos, com eco na comunidade internacional, levou o presidente dos EUA a sentir-se
pressionado, ao que reagiu de
modo peculiar: "Não posso apertar um botão e reinstalar Zelaya
no cargo", disse Obama no início
de agosto. Aproveitou a ocasião
para alfinetar aqueles que antes
criticavam a ingerência dos EUA
em países do continente e agora
se queixavam "de não estarmos
interferindo o suficiente".
Pois anteontem os EUA apertaram o botão. Um acordo entre
o presidente deposto e o governo
interino foi costurado pela equipe capitaneada por Thomas
Shannon, responsável no Departamento de Estado pela América
Latina -e embaixador indicado
pela gestão Obama para o Brasil-, seu vice, Craig Kelly, e Dan
Restrepo, do Conselho de Segurança Nacional.
A proposta mantém as eleições
presidenciais para o próximo dia
29. Até lá, caberá ao Congresso
aprovar ou não a volta do país à
ordem anterior a 28 de junho, dia
da expulsão de Zelaya. Caso o Legislativo a endosse, Zelaya cumprirá um simbólico final de mandato, e Roberto Micheletti, hoje
presidente, reassumirá a chefia
do Congresso -o vice renunciara para concorrer no pleito.
O desfecho do caso deixa o governo brasileiro e seus pares regionais numa situação desconfortável. Por mais que seja louvável a pretensão de países latino-americanos de solucionar conflitos regionais de maneira "autônoma", sem a interferência direta da grande potência mundial, o
fato é que um acordo em Honduras só se tornou viável quando os
americanos entraram em cena.
O episódio serve de lição para o
Brasil, que desempenhou em toda essa história o papel de aprendiz de feiticeiro. Ao negar-se,
desde cedo, a dialogar com Micheletti, o Itamaraty ignorou sua
tradição de pautar-se pela não
ingerência e pela solução mediada de conflitos. Assumiu uma
atitude quase estudantil, inábil e
intransigente. Inviabilizou-se
como negociador.
A linha adotada pela gestão Lula também contrasta com o fato
de o atual governo sentar-se à
mesa com ditadores os mais variados e eximir-se de condenar,
por exemplo, a ditadura sudanesa, por sua responsabilidade na
campanha de "limpeza étnica",
responsável pela morte de 300
mil pessoas no país africano.
Ao abdicar do papel de intermediador e deixar que a embaixada em Tegucigalpa se transformasse em sede de um comitê de
agitação política, o governo brasileiro demonstrou amadorismo
ao assumir as novas responsabilidades que o futuro parece reservar ao país.
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