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Iguais e diferentes
Apesar da retórica agressiva, Dilma Rousseff e José Serra guardam mais semelhanças do que divergências em seus diagnósticos e propostas
Não faltaram trocas de acusações, ânimos exaltados e lances
de fantasia mercadológica à campanha presidencial. Tanto ruído
terminou por substituir, de modo
não de todo inconveniente aos
candidatos, a discussão de propostas concretas para o país.
Afinal, quais são as diferenças,
no que tange às diretrizes políticas, entre Dilma Rousseff e José
Serra? A petista e o tucano não se
deram ao trabalho de apresentar
com antecedência documentos
que merecessem o nome de programas de governo. Se a candidata da situação divulgou tardiamente uma vaga carta de intenções, com 13 "compromissos programáticos", seu opositor coligiu
entrevistas e declarações em sua
página na internet.
Os debates e a propaganda eleitoral, equivalentes em pasteurização e diversionismo, apenas contribuíram para aumentar a agressividade superficial da disputa.
Privatização e aborto foram os
temas que predominaram no segundo turno -mas, tratadas de
maneira oblíqua, tais questões foram simplificadas e manipuladas
com intuito antes de assustar do
que de esclarecer o eleitor.
A tentativa de mapear o que
houve de discussão substantiva
na campanha encontrará, na verdade, mais semelhanças do que
diferenças nos diagnósticos e propostas dos dois candidatos.
Não surpreende que seja assim.
Ao longo dos últimos 16 anos, sob
os governos de Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula
da Silva, as principais correntes
políticas alcançaram aos poucos
consensos mínimos, que se mostraram benéficos para o conjunto
da população. O próximo presidente herdará um país em que a
manutenção da estabilidade da
moeda e dos mecanismos de seguridade e inclusão social são objetivos inquestionáveis.
Isso se traduziu, na campanha,
na adesão de Dilma e Serra aos pilares da política econômica adotados no segundo mandato de FHC:
metas de inflação perseguidas
com independência pelo Banco
Central, realização de superavit
fiscais para abater a dívida pública e câmbio flutuante.
A convergência também aparece no apoio ao Bolsa Família. Dilma tem no programa de distribuição de renda um valioso instrumento para cumprir a difícil promessa de "erradicar a miséria" no
Brasil. Serra promete duplicar a
abrangência do benefício-tarefa
tampouco de fácil execução.
São coincidentes, ainda, as avaliações sobre as carências na infraestrutura, no saneamento básico, na saúde e na educação.
Tucano e petista prometem
priorizar o ensino médio, com a
criação de escolas técnicas. Um
milhão de novas vagas para esse
tipo de formação é o compromisso
do tucano -enquanto a petista
afirma que irá construir centros de
educação profissionalizante em
quase 600 municípios do país.
Na saúde, pretendem aumentar
o número de unidades descentralizadas de atendimento, como forma de diminuir a espera e melhorar a qualidade do serviço médico.
Para ampliar a cobertura de saneamento básico, ambos acenam
com a desoneração tributária de
investimentos.
Mas há diferenças. Em contraste com a política externa do governo, que enfatiza as relações "Sul-Sul", o tucano defende a realização de acordos bilaterais de comércio com países ricos e em desenvolvimento. Em sua visão, o
Mercosul não deve limitar o comércio do Brasil com outras nações. Na campanha, criticou a diplomacia brasileira por ser condescendente com governantes de
países produtores de droga ou que
violam direitos humanos -como
é o caso do Irã.
Quanto ao modelo de Estado, a
oposição sempre atacou o enfraquecimento, sob Lula, das agências reguladoras e o que vê como
excesso e ineficiência de gastos do
governo federal. Serra defende
mecanismos de gestão que considera menos propícios à incrustação de grupos na máquina estatal,
como as Organizações Sociais, espécie de parceria público-privada,
implantadas pelas administrações do PSDB em São Paulo.
Embora os dois candidatos tenham acenado com reduções de
impostos, as espinhosas questões
das reformas tributária e da Previdência foram deixadas de lado.
Os brasileiros vão hoje às urnas
escolher entre dois candidatos
moderados, com divergências de
grau, que não devem promover
solavancos ou mudanças radicais.
Não deixa de ser um sinal de amadurecimento político do país.
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