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Elio Gaspari

A Bolsa-Fiemg vale o IPI de 10 mil armários

Se Robson Andrade tivesse dado a Pimentel dinheiro da sua empresa, não deveria explicações

A Bolsa Consultoria que o ministro Fernando Pimentel recebeu em 2009 da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (R$ 1 milhão por nove meses de sabe-se lá o quê) teve pelo menos uma utilidade: jogou luz sobre a contabilidade e a conduta do sindicalismo patronal de Pindorama.

O então presidente da Fiemg, Robson Andrade, mimou o ex-prefeito de Belo Horizonte, recorrendo ao cofre das contribuições compulsórias tomadas às empresas com base nas suas folhas de pagamento.

Em 2009, o chamado Sistema S arrecadou R$ 12,7 bilhões, valor semelhante ao custo do Bolsa Família. A arca do seu ramo industrial ficou com R$ 2,9 bilhões.

Andrade, atual titular da Confederação Nacional da Indústria, preside a Orteng, uma empresa de equipamentos e sistemas estabelecida no Centro Industrial de Contagem, com 1.500 empregados e vendas acima de R$ 400 milhões em 2009.

Entre as muitas, e desconexas,

explicações dadas pelo doutor, houve uma que poderia liquidar a questão: "O Pimentel, na época, também fez, a pedido da Federação das

Indústrias, uma série de palestras nas regionais. Ele participou de

palestras nessas regionais e também em outras cidades-polo da indústria mineira".

Beleza. A Fiemg mostra a planilha das palestras, Pimentel mostra sua agenda, chega-se ao valor de cada fala e quem insistir no assunto estará perseguindo o ministro.

O repórter Thiago Herdy foi atrás dessa conta. Procurou as dez regionais e nenhuma conseguiu dizer quando Pimentel fez sua palestra.

Achou só uma fala, em Contagem, organizada pela federação. Procurado para esclarecer o mistério, o atual presidente da Fiemg pediu tempo "para pensar" e calou-se. A CNI disse o seguinte: "A diretoria de comunicação informa que todos os esclarecimentos sobre a consultoria à Fiemg já foram dados".

Dados, foram, mas não esclarecem coisa alguma. A resposta foi arrogante e mistificadora. Coisa de quem se julga no direito de não dar satisfações a respeito do que fez com o dinheiro alheio.

Se Robson Andrade tivesse dado a Pimentel R$ 1 milhão da caixa da Orteng, poderia dizer que isso não é da conta de ninguém, mas deu um dinheiro que foi compulsoriamente arrecadado à custa do trabalho alheio, tanto de empregadores como de empregados.

Um milhão de reais por nove meses de contrato equivalem a R$ 111 mil por mês. Grosseiramente, esse é o valor mensal da soma de todos os tributos e contribuições que uma empresa média, com algo como 30 a 50 funcionários, paga à Viúva.

As indústrias dão ao Sistema S uma contribuição de 2,5% sobre o valor de suas folhas de pagamento. Para gerar o dinheiro da Bolsa Consultoria de Pimentel, precisa-se de uma folha mensal de R$ 4,4 milhões. O doutor embolsou o equivalente à contribuição compulsória de uma indústria que emprega mil trabalhadores com salários de R$ 4.400.

Distribuir o dinheiro alheio é coisa velha, mas o doutor Robson Andrade tem mais interesses na agenda. No mesmo dia em que foi revelada a inconsistência da teoria das palestras, a CNI divulgou o conteúdo de entrevista coletiva na qual diz que ele apontou gargalos que inibem a competitividade da indústria brasileira e destacou a "legislação trabalhista cara e anacrônica".

Andrade defende cortes de tributos na produção de bens de capital, eletroeletrônicos, têxteis e moveleiros. Sindicalista patronal moderno é assim: corte-se tudo, menos as contribuições para o Sistema S, nem se pretenda olhar como esse dinheiro é gasto nas federações, ou perguntar como se concedem as Bolsas Consultoria.

Admita-se que a Viúva resolva zerar o IPI dos móveis. Sem o imposto, um guarda-roupas Santos Andirá, que as Casas Bahia vende a

R$ 999,90, poderia sair por R$ 900. A ideia é ótima, e já funcionou.

Estimulando-se o consumo, assegura-se a produção e garantem-se empregos. Com a Bolsa Consultoria de Pimentel, a Fiemg gastou, num só emprego, ervanário equivalente ao que a Viúva arrecada com o IPI cobrado na venda de 10 mil guarda-roupas.

BASTA

O PanAmericano foi o último sapo que a grande banca engoliu, pagando a conta com o dinheiro do Fundo Garantidor de Créditos. Como os grandes bancos recusam-se a fazer certo tipo de negócios, eles pousam em casas menores. Quando elas quebram, o FGC fica com o prejuízo.

Como há gente na fila do socorro, vêm por aí fortes emoções.

ENCOSTOS

Dilma Rousseff resolveu colaborar na blindagem do ministro Fernando Pimentel, e as brigadas governistas na Câmara e no Senado bloquearam cinco iniciativas para que ele fosse chamado a se explicar no Parlamento.

Tudo bem, manda quem pode, e obedece quem tem juízo.

Passados dez anos, o PSDB talvez tenha se dado conta de que foi bobagem bloquear a instalação da CPI das Privatizações.

O assunto virou um encosto, assim como encostos virarão as Bolsas Consultoria dos companheiros.

MENSALÃO

O principal item da agenda do comissariado petista para 2012 continua a ser a esterilização do processo do mensalão.

Se os companheiros conseguirem, terão direito ao título de craques do ano. Resta saber que título poderá reivindicar o Supremo Tribunal.

MADAME NATASHA

Madame Natasha zela pelas relações do idioma com os bons modos e intrigou-se com a quantidade de mensagens eletrônicas vindas de pessoas que jamais viu, convidando-a para fazer isso ou aquilo, com um terrível fecho:

"Aguardo retorno".

A senhora crê que esse tom imperativo só se justifica quando o remetente tem uma relação de superioridade hierárquica com o destinatário, maus modos e maus bofes.

Natasha sugere:

"Agradeço seu retorno".

Não custa ser gentil.

O SONO DO IPHAN

Graças ao repórter Luiz Ernesto Magalhães, descobriu-se que a privataria do aterro do Flamengo produziu um estacionamento para mil automóveis. Onde? Nos jardins de Burle Marx.

Uma das empresas, a Time For Fun, assinou um termo de responsabilidade com o Instituto do Patrimônio Histórico, comprometendo-se a respeitar as áreas tombadas. Onde o Iphan viu espaço para o estacionamento dos frequentadores do Cirque du Soleil numa área integralmente tombada, não se sabe.

Que a privataria queira tomar o parque, entende-se. O que não se entende é a sonolência do Iphan.

ALÍVIO

No dia 10 de outubro, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (antigo Conselho de Contribuintes) anulou uma autuação de 2009 no valor de R$ 4,2 bilhões, feita pela Receita Federal contra o Banco Santander.

A rotina desses processos é habitualmente demorada, mas até hoje a decisão não foi publicada no "Diário Oficial".

Há outro processo, no valor de R$ 2 bilhões, do mesmo banco, à espera de julgamento.

ATO FALHO

O ministro Fernando Pimentel integrava a delegação brasileira na reunião da Organização Mundial do Comércio que ampliou o tratado anticorrupção de 1994, para regular compras e contratos de governos.

O Brasil recusou-se a aderir à iniciativa, que junta 42 países.

O chanceler Antonio Patriota não viu na recusa nenhum desinteresse no combate à corrupção: "Mais comprometidos que estamos nisso?"

Comprometidos com o quê? Com o combate ou com a própria?

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