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O general na mira

José Antônio Belham, o oficial responsabilizado pela Comissão da Verdade pela morte de Rubens Paiva, afirma que vai processar seus acusadores

LUCAS FERRAZ DE SÃO PAULO

Por décadas livre de suspeitas de envolvimento com crimes da ditadura (1964-1985), o general reformado do Exército José Antônio Nogueira Belham, 79, tornou-se o mais novo vilão do período.

Um dos militares responsabilizados pela Comissão Nacional da Verdade pela morte do ex-deputado Rubens Paiva, e o único vivo entre eles, Belham é alvo também de investigação do Ministério Público Federal. Ele deve ser denunciado pelo crime de ocultação de cadáver.

Rubens Paiva morreu no DOI-Codi (centro de repressão) do Exército, no Rio de Janeiro, em janeiro de 1971. Seu corpo nunca foi encontrado.

Segundo reportagem publicada ontem pelo jornal "O Globo", um oficial que deu entrevista sob a condição de anonimato diz que em 1973 desenterrou os restos mortais de Paiva de uma praia do Rio e os jogou em alto mar.

Belham chefiou o DOI (Destacamento de Operações de Informações) do Rio entre outubro de 1970 e junho de 71. Além de Paiva, outros nove opositores da ditadura morreram ou desapareceram no local nesse período.

Um deles é Carlos Alberto Soares de Freitas, amigo de militância da presidente Dilma Rousseff, cujo corpo também nunca foi localizado.

Como chefiava o centro do Exército, as investigações tanto da comissão quanto do Ministério Público Federal apuram a responsabilidade de Belham nessas mortes.

"Nunca tomei conhecimento de nada", afirmou ele à Folha, por telefone. "Quando passar tudo isso e ficar comprovado que não tive ligação nenhuma, vou processar todo mundo por essas acusações."

O militar estava de férias quando Rubens Paiva foi preso e morto. Mas documento que ele próprio apresentou em sua defesa mostra que o militar teve as férias suspensas em alguns dias de janeiro, recebendo diárias para uma missão sigilosa.

Contra todas as evidências, o general diz que o documento é "mentiroso" e que ficou "todo o mês de férias".

Dois militares afirmaram à Comissão da Verdade que Belham fora alertado de que as torturas poderiam matar Paiva. O outro acusado pela morte do ex-deputado é o tenente Antônio Fernando Hughes de Carvalho, morto em 2005, que o teria torturado.

"Não tenho nada a ver com isso", insiste Belham. "Passaram-se 43 anos, faz muito tempo. Muita gente [envolvida] já morreu."

PRESTIGIADO

O nome de Belham apareceu na investigação do caso Rubens Paiva acidentalmente. Em novembro de 2012, documentos foram encontrados na casa de um coronel reformado do Exército, morto em um assalto, em Porto Alegre.

Os papéis foram repassados à Justiça e à Comissão da Verdade. Entre eles constava um termo do Exército que confirma a apreensão de objetos pessoais de Rubens Paiva no DOI-Codi.

No termo havia uma menção a Belham, pista de que ele teve acesso aos objetos. Com as investigações, surgiram as provas testemunhais e o documento sobre a interrupção de suas férias.

Ao contrário de seu colega na Academia Militar das Agulhas Negras (da turma de 1954), coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que chefiou o DOI de São Paulo e é acusado de inúmeros crimes, como o de tortura, não há indícios de que Belham tenha participado pessoalmente de sessões de tortura.

"Como chefe, ele tinha o controle de tudo que passava lá. O general sabe para onde foi levado o corpo de Rubens Paiva", diz Pedro Dallari, coordenador da comissão.

INATINGÍVEL

Pai de um diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), Ronaldo Martins Belham, o militar se considerava inatingível. Instrutor do atual comandante do Exército, Enzo Peri, no Colégio Militar do Rio, no final dos anos 1950, ele é prestigiado nas Forças Armadas, com reputação de "militar humanista".

Seu prestígio havia sido arranhado em 2010, quando foi demitido da vice-presidência da FHE (Fundação Habitacional do Exército) após uma polêmica com viúvas de militares mortos no terremoto do Haiti. Era a primeira mancha em sua carreira militar.

Três viúvas recorreram à Justiça contra a FHE e o Bradesco alegando terem direito a um seguro maior do que o que haviam recebido. Elas foram recepcionadas pelo então vice-presidente da FHE.

"Ele foi muito arrogante, mal educado e nos destratou muito", diz Cely Zanin, uma das presentes na reunião. "Ele nos ameaçou, dizendo que se fôssemos para a Justiça poderíamos ser obrigadas a devolver todo o dinheiro que já havíamos recebido", lembra ela.

O general acabou demitido. Sobre o episódio, Belham disse que foi "injustamente" julgado por "versões fantasiosas, distorcidas e mentirosas". O Exército, por sua vez, informou à Folha que a demissão do militar "ocorreu de acordo com as normas".


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