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Janio de Freitas

Tudo em uma resposta

Comissão da Verdade quer conhecer processo de escolha dos que viriam a praticar os crimes da repressão militar

As respostas, sobretudo se uma delas for respondida verazmente, poderão modificar o conceito vestido pelas Forças Armadas desde que adotaram, como norma, a defesa e proteção dos seus integrantes responsáveis, por comando ou execução, pelos crimes de tortura, assassinatos e desaparecimentos. Mas a disposição de dar respostas a quesitos da Comissão Nacional da Verdade não tem, por si só, o sentido de "avanço" que lhe está atribuído: há muito tempo as Forças Armadas já reconheceram, ainda que sem o desejarem, as práticas criminosas em seus quartéis.

"Alguns praticaram excessos" foi uma expressão repetida durante muitos anos, diante do acúmulo de evidências incriminadoras. Reduzir crimes monstruosos a "excessos" era estúpido, mas nem por isso seu sentido essencial diminuía-se: excesso ou não, estavam ali reconhecidas "as práticas".

Uma pergunta sobressai entre os quesitos propostos pela Comissão Nacional da Verdade. Ela quer conhecer o processo de escolha dos que viriam a praticar os crimes da repressão militar. A Comissão faz diplomacia, referindo-se a escolhidos para "atividades diferentes das determinadas pelas Forças Armadas". Pouco importa, o teor da pergunta é que vale.

Se a resposta for honesta, fará ou proporcionará revelações decisivas para o conhecimento, fundamental, do que preparou e do que se passou no sistema da repressão por meio de crimes. A começar da constatação de que a disponibilidade para envolver-se com tal atividade foi providenciada com muito mais fartura do que se poderia supor, por matrizes de formação ignoradas pela sociedade.

MUITO À VONTADE

No despacho em que acusa o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, de não investigar as denúncias contra os presos do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa ora lhes atribui "irregularidades", como certeza consumada; ora "fatos narrados", o que nada assegura sobre fatos reais; "aparentes regalias", ou meros aspectos; e, de repente, seguro e definitivo, "ilegalidades".

Tudo isso a propósito das "regalias" e "privilégios" de Delúbio Soares e José Dirceu, e agora, por denúncia na Folha, de Valdemar Costa Neto.

Em fins de fevereiro, Delúbio teve cassadas as suas saídas para trabalho externo, porque um carro da CUT, onde trabalhava, estacionou no pátio da penitenciária. De volta ao regime fechado por um mês, Delúbio recuperou agora o semifechado. No fim de fevereiro encerrou-se o prazo de uma "investigação" para saber se Dirceu, em 6 de janeiro, falou ou não em um celular. Está há muitos dias pendente de Joaquim Barbosa a decisão sobre o emprego de Dirceu em um escritório de advocacia. Valdemar será investigado porque repórteres o acampanaram durante dias, como fazem os tiras, e comprovaram que ele foi acompanhado pela mulher no percurso para o trabalho, aí recebeu dois deputados e, nada menos grave, compraram-lhe um sanduíche na volta à cadeia.

Os dois petistas, e alguns colegas de prisão, foram acusados ainda da "regalia e privilégio" de comer um churrasco na Papuda. Razão bastante para que promotoras brasilienses peçam as transferências de Dirceu e Delúbio para presídio federal.

Espanta que a tantos juízes, promotores e jornalistas não haja ainda ocorrido, ao menos como hipótese, uma ideia simples. A de que o autor e responsável por "privilégios e regalias" não é quem os desfruta, mas quem os proporciona. Só os parlamentares brasileiros estão livres dessa regrinha.

Delúbio não dirigia o carro da CUT, Delúbio não abriu os portões para o carro. Nem se provou que o carro entrasse na penitenciária para pegá-lo. O churrasco, ao fim de importantes investigações, não saíra do açougue. O uso de celular por Dirceu foi negado pela penitenciária, mas teve depoimento do acusado por exigência do juiz Bruno Silva Ribeiro e duas diferentes sindicâncias. Para a conclusão de que não existiu.

Em que lei está a obrigação de que Valdemar Costa Neto almoce sozinho, não possa falar com a própria mulher a caminho do emprego, esteja proibido de comprar um sanduíche para suprir o jantar perdido no presídio? E quem adivinhou que os deputados fizeram com ele "reunião política"?

Dizer, publicar e dar despachos à vontade são "privilégios e regalias".


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