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Elio Gaspari

Marina e a confidencialidade

Prometer uma nova política em campanha eleitoral é bom (e fácil), desde que se demarque onde acaba a velha

Há uma semana, os repórteres Fernanda Odilla e Aguirre Talento mostraram que, entre março de 2011 e maio deste ano, Marina Silva assinou 65 contratos, fez 72 palestras e recebeu R$ 1,6 milhão de seus clientes. Ela e sua empresa não informam quem foram os fregueses, pois os contratos tinham uma cláusula de confidencialidade. Jogo jogado.

Nessa faina, ela ganhou menos que Lula ou Fernando Henrique Cardoso. Um quebrou a barreira do milhão de dólares em apenas quatro meses. O outro, em um ano. Ambos, como Marina, fazem dezenas de palestras sem cobrar. Ambos, como Marina, não divulgaram as listas de quem pagou. Nenhum deles é obrigado a fazê-lo, nem seria justo cobrar isso da candidata se ela não se anunciasse como arcanjo de uma nova política. "Cláusula de confidencialidade" é uma expressão maldita desde que o ex-ministro Antonio Palocci usou-a para não revelar os clientes de sua consultoria. Todo mundo ganharia se a nova política exigisse a divulgação voluntária dessas listas. (Quem quiser cobrar isso também aos jornalistas é bem-vindo.)

Marina faz em ponto menor o que fazem os outros. Novamente, jogo jogado. O problema surge quando ela explica:

1 - O PT estaria criando um "factoide". Falso, o fato surgiu com a reportagem, baseada em documentos fornecidos pela campanha da própria candidata.

2 - "Nós pagamos todos os encargos, está na Receita Federal." Ninguém diz que Marina deixou de cumprir suas obrigações legais. A curiosidade está na lista que, repetindo, ela não tem obrigação de revelar. Poderia, contudo, pedir aos clientes que a desobrigassem da cláusula de confidencialidade. Um, dois, três, quantos quiserem.

O novo é sempre bem-vindo, mas é sempre útil saber-se onde acaba o velho.

EICHMANN NADA TINHA DE BANAL

A edição americana de um livro sobre o nazista Adolf Eichmann lançou mais luz sobre os 12 anos em que ele viveu na Argentina, até seu espetacular sequestro em Buenos Aires, em 1960, por um comando israelense. É "Eichmann antes de Jerusalem" ("Eichmann Before Jerusalem"), da alemã Bettina Stangneth. Ela revisitou 30 arquivos e contesta a construção da filósofa Hannah Arendt, para quem aquele burocrata que coordenou o extermínio de milhões de judeus simbolizava a "banalidade do mal". A ideia podia estar certa, mas foi aplicada à pessoa errada.

Stangneth sustenta que Eichmann foi um mestre da dissimulação, criando o mito de que fora um burocrata e se tornara um modesto recluso em Buenos Aires, cuidando da família. Ele era frequentador regular de uma roda de nazistas renitentes, pretendia publicar um livro de memórias e voltar à Alemanha, onde talvez recebesse uma pena leve. (A Justiça israelense julgou-o e mandou-o à forca.) Gravou depoimentos e escreveu algo como 1.300 páginas, inclusive uma carta aberta ao chanceler Konrad Adenauer. Teria como editor um argentino germanófilo que defendia uma "perspectiva étnica" para a América Latina, ameaçada pela "turba mulata" do Brasil.

Eichmann foi identificado por um cego, pai da namorada do filho de um certo "Ricardo Klement". Stangneth mostra que o cego não foi a única fonte do promotor alemão que deu pistas aos israelenses. Ela leu documentos que Hannah Arendt nunca viu e, de enigma em enigma, criou mais um. A segunda fonte teria sido um judeu polonês que fugiu do campo de Sobibor e emigrou para o Brasil. Os fugitivos foram 47, e dois vieram para cá: Chaim Korenfeld, a respeito de quem ela nada conseguiu saber, e Stanislav Szmajzner, que prosperou como joalheiro. Ele publicou um livro de memórias em 1968 (oito anos depois da captura de Eichmann), e não tocou no assunto.

BAIXA INTENSIDADE

O programa de governo de Marina saiu como saiu porque foi montado às pressas, recauchutando o de Eduardo Campos.

Se tivesse sido debatido no regime de "democracia de alta intensidade", que repetidamente defende, talvez ficasse pronto durante o Carnaval.

DANÇA DA AMBIÇÃO

Há um mês, o tucanato inebriava-se com os sinais de fumaça que recebia de gente que estava no governo e pretendia continuar.

Hoje, preocupa-se com alguns de seus caciques que, antes mesmo da eleição, mandam os mesmos sinais para Marina Silva.

PRAÇAS VAZIAS

Durante as eleições municipais de 2012, Lula teve os primeiros sinais de que as plateias voluntárias para seus comícios estavam encolhendo. Num, em Osasco, encalharam as garrafinhas de água que os vendedores ofereciam.

Há pouco, ele foi a São José dos Campos e sobrou praça.

BOA BRIGA

Seja quem for o vencedor da eleição presidencial, deverá começar a trabalhar antes mesmo do segundo turno. No dia 6 de outubro estarão eleitos os deputados. No dia 1º de fevereiro eles chegam a Brasília e, no dia seguinte, elegem a Mesa da Câmara.

Se o novo presidente dormir no ponto, o velho e bom PMDB colocará na cadeira o deputado Eduardo Cunha, atual líder de sua bancada na Câmara. Quem reclamar depois, estará com conversa de mau perdedor.

O doutor está trabalhando duro, e o Planalto sabe o que acontece quando ele trabalha.

EREMILDO, O IDIOTA

Eremildo é um idiota e não entendeu um aspecto da charada do jatinho em que viajava Eduardo Campos. O avião era de laranjas. Mas as laranjas eram de quem?

Mesmo sendo cretino, Eremildo nunca viu laranja sem dono.

EREMILDO, O IDIOTA (BIS)

Ao saber que o Poder Judiciário mandou a Universidade de São Paulo pagar os salários de seus servidores parados há mais de cem dias, o cretino reergueu sua velha bandeira:

"Greve geral até a vitória final, com pagamento dos dias parados."

PURGATÓRIO

A declaração da doutora Dilma de que pretende mudar sua equipe caso seja reeleita deixou o ministro Guido Mantega na pior das situações.

Conseguiu bater o recorde de permanência no cargo, que era de Pedro Malan, com oito anos, mas criou uma nova marca: ficará cinco meses no limbo dos ministros fritos.

RÁDIO MEC

A rádio Ministério da Educação foi uma glória da cultura brasileira. Sua sede de cinco andares está fechada desde março do ano passado. Como ela continua no ar, pouca gente se dá conta disso. Os estúdios, o auditório e o acervo estão fechados a cadeado. Em novembro, a doutora Dilma recebeu uma carta assinada por dezenas de intelectuais, entre os quais estavam Fernanda Montenegro, Chico Buarque de Holanda e Maria da Conceição Tavares. Não houve resposta, nem para explicar por que o patrimônio da emissora ficou às traças. Isso num governo que tentou criar, em Brasília, uma rede nacional de televisão.

Curiosidade: em 1936 essa rádio foi doada por Roquette Pinto à Viúva.


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