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União demora 20 anos para cobrar 'desvio' de R$ 300 mi

Irregularidade com verba do SUS em 1991 gera maior cobrança da CGU em 2011

Quantia foi repassada à Fundação Adib Jatene, do governo de SP, na era Collor; envolvidos negam desvio de verba

BERNARDO MELLO FRANCO
DE SÃO PAULO

A União tenta recuperar R$ 302,9 milhões desviados do Ministério da Saúde há 20 anos, segundo auditoria concluída pela pasta em 1995. A verba foi repassada ainda no governo Fernando Collor, mas a cobrança só foi feita no ano passado pela CGU (Controladoria-Geral da União).

A quantia encabeça os pedidos de devolução de verbas federais realizados pelo órgão em 2011, de acordo com balanço divulgado anteontem.

Dos cinco gestores responsabilizados, um já morreu, e os demais prometem recorrer para evitar o pagamento.

O convênio foi assinado em 1991 com a Fundação Adib Jatene, do governo paulista, para financiar serviços médicos e hospitalares a pacientes em tratamento do coração.

Os repasses duraram quatro anos. Em 1995, perícia do ministério apontou "desvio de finalidade". Em vez de beneficiar os doentes, o órgão usou a verba para cobrir despesas de pessoal e custeio.

Depois de duas décadas, o Ministério da Saúde enviou o caso à CGU em 2011. Uma nova auditoria confirmou as irregularidades, e o relatório com a cobrança foi remetido ao TCU (Tribunal de Contas da União) no último dia 21.

De acordo com o documento, 78% dos recursos para atender pacientes foram gastos com pessoal. O resto financiou compra de equipamentos e "outras despesas estranhas aos objetivos do SUS".

O Ministério da Saúde informou que "desencadeou ações, diligências e enviou notificações e cobranças aos responsáveis pela execução do convênio" desde 2005.

Concluiu nova tomada de contas em 2010, "tendo em vista que as ações anteriores não tiveram êxito quanto ao ressarcimento do recurso aos cofres da União". A pasta não esclareceu por que levou 20 anos para acionar a CGU.

Informado do caso pela Folha, o coordenador de defesa da probidade da AGU (Advocacia-Geral da União), Tércio Tokano, se disse surpreso.

"A recuperação de valores desviados demora mesmo, mas não tanto assim. Uma cobrança se arrastar desde 1991 é algo absurdo", afirmou.

"Em tese, ainda é possível cobrar. Mas na prática é muito difícil, porque às vezes o devedor nem está mais vivo."

OUTRO LADO

O advogado de Valmir Fernandes Fontes, ex-diretor da Fundação Adib Jatene, disse que a cobrança é "antijurídica". "Houve decadência do prazo. O convênio começou em 1991. A cobrança não pode mais ser feita", afirmou Francisco de Assis Alves.

Segundo o advogado, o uso da verba foi "correto" e os envolvidos não enriqueceram.

Fontes contestou a CGU. "É estranho isso acontecer agora. Foi um presente do Papai Noel", disse. "Estou tranquilo. Isso não existe, é invenção do Ministério da Saúde."

O ex-secretário de Saúde de SP Nader Wafae disse que o convênio foi assinado em gestão anterior à dele e que seguiu parecer jurídico do órgão ao mantê-lo. Os ex-secretários Vicente Amato Neto e Cármino de Souza não foram localizados. José Aristodemo Pinotti morreu em 2009.

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