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Minha história Rodrigo Cunha

13 Anos de espera

Filho de deputada morta se prepara para o julgamento do crime. "Foi difícil escutar: 'Por que você não vai lá e resolve isso?'"

SÍLVIA FREIRE
DE SÃO PAULO

RESUMO O advogado Rodrigo Cunha, 30, tinha 17 anos quando sua mãe, a deputada federal Ceci Cunha (PSDB-AL), e seu pai, Juvenal Cunha, foram mortos a tiros em Maceió. O crime aconteceu no dia em que Ceci foi diplomada pela Justiça, em 1998. Um cunhado da deputada e a mãe dele também morreram. O então deputado Talvane Albuquerque, eleito pelo PTN, foi denunciado como mandante. Ontem, os cinco acusados de participar do crime começaram a ser julgados.

Alagoas ainda tem fama de ser terra de pistoleiro, onde a gente tem que revidar. Foi difícil escutar as pessoas dizendo: "Rapaz, por que você não vai lá e resolve isso?"

Em 16 de dezembro de 1998, minha mãe, a deputada Ceci Cunha, foi diplomada para mais um mandato. Era um momento de muita alegria para nós. Na época, eu tinha 17 anos.

No dia do crime, comecei a receber telefonemas de pessoas que não costumam me ligar. Perguntavam se estava tudo bem, eu dizia que sim, desligavam. Tentava falar com meus pais, mas não conseguia. Telefonei para a minha irmã, na época com 19 anos, que disse estar recebendo as mesmas ligações.

Não tivemos dúvida de que alguma coisa tinha acontecido com nossos pais.

Começamos a percorrer os hospitais. Ninguém tinha coragem de nos dizer.

Ao chegar ao terceiro hospital, um taxista falou ter ouvido que tinham matado a deputada e toda a família dela. Abracei minha irmã e começamos a chorar.

Depois entendemos que as pessoas ligavam para a gente porque pensavam que também tínhamos sido mortos.

Foi um crime que marcou nossa vida. Em 2000, Talvane Albuquerque [acusado de ser o mandante do crime] se matriculou na mesma faculdade de direito que eu, em Maceió. Desisti do curso. Não conseguiria conviver com ele.

Seis meses depois, fiz vestibular em outra faculdade.

Nossa cultura é resolver as coisas na bala, acredito que pela certeza da impunidade. Mas minha índole e minha educação nunca foram essas.

Meu caminho foi o mais sofrido: ir atrás da Justiça mesmo sabendo que os bandidos que tinham matado meus pais estavam soltos.

Via os acusados indo a restaurantes, à praia, como se não tivessem feito nada. Ficaram presos por pouquíssimo tempo.

O JULGAMENTO

Nada justifica a demora de 13 anos para o julgamento. O processo está bem instruído, não existem duas versões e há provas robustas. Mas os advogados de defesa sempre conseguiam adiar.

O que mais eu ouvia era: "Não se iluda, não vai dar em nada". Eu respondia: acredito e vou lutar para isso.

Criei um site [www.queremosjustica.com.br], que reúne o conteúdo do processo. Há um vídeo de um dos assassinos confessando.

Muitos acham que eu digo que foi Talvane o mandante porque ele foi o único beneficiado com a morte de minha mãe. Mas tenho certeza pelas provas do processo. Acredito na condenação.

Estou preparado para acompanhar o julgamento. Será uma carga emocional muito forte, mas é necessário para fechar o ciclo, cicatrizar feridas e virar a página.

Até hoje não vi foto do crime. Acredito que, no julgamento, quando mostrarem as imagens, vou fechar os olhos.

Quero guardar a imagem da minha mãe e do meu pai como pessoas felizes.

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