Entrevista francisco de oliveira, 81
Brasil vai voltar a crescer e panelaços irão acabar
Segundo sociólogo, PT não tem projeto de país e Lula terá de se realinhar de forma radical para manter poder em 2018
A crise parece muito grande, mas não é. O Brasil voltará a crescer, tem uma economia privilegiada e será uma sociedade mais igualitária. A burguesia do país é muito autoritária, mas seu jogo não vai prosperar. Os panelaços não terão continuidade.
A análise é do sociólogo Francisco Maria Cavalcanti de Oliveira, 81. Para ele, o país vive como num baile, onde tudo está em movimento, o que gera sensações de pressa e angústia. "Isso é ótimo. A pior coisa é a estagnação."
Fundador do PT e do PSOL, professor aposentado da USP e autor de clássicos como "A Economia Brasileira: Crítica à Razão Dualista" (1972), ele condena a ausência de ousadia dos últimos governos.
"Brizola é o grande político que falta no Brasil. Falta alguém com audácia."
Crítico do lulismo, que classifica como conservador, diz que é possível, mas não provável, a derrota do PT em 2018. Na sua visão, Lula vai precisar se realinhar de forma radical, fazendo política de forma mais contundente, ou os tucanos voltarão ao poder.
Leia trechos da entrevista:
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Folha - O que está acontecendo no Brasil?
Chico de Oliveira - A crise parece muito grande, mas não é. A concentração da crítica na Dilma é fogo de palha. Nem ela mesma tem o controle do partido dela. O controle ainda é do Lula. As posições se acirraram porque tem PT de um lado e tucanos de outro. Todo o meio desapareceu. A consolidação de posições opostas dá essa sensação de que está tudo muito ruim, mas não está, não. É uma conjuntura cíclica.
Como avalia o governo? O que Dilma faz de bom e de ruim?
Nem nada de muito bom nem nada de muito ruim. É um governo médio e medíocre. Ela não é responsável pelos grandes males do país nem tem solução para eles. É uma presidente fraca. Votei com convicção nela nas duas vezes e não estou decepcionado. O governo não tem respostas para quase nada, mas não faz o programa do PSDB. Felizmente, apesar de governos fracos, a tentação autoritária não está voltando.
A ascensão de movimentos mais conservadores nas ruas e no Congresso o preocupa?
Não me preocupo porque os tucanos não são populares. Não conseguirão galvanizar essa tentativa de desestabilização com apoio popular. Os tucanos sempre evitam recorrer às ruas. Panelaço não é o povo quem faz. Esse tipo de movimento não tem continuidade. Já o PT não pode mover-se com a facilidade que tinha antes de ser governo. Não acredito que o PT tenha solução para nada.
Há uma ascensão da direita?
Não vejo. A direita existe mais na imprensa do que no movimento real de setores da população. A sociedade brasileira é diversificada e não comporta direita extremada.
A discussão do impeachment não vai para frente. Renan Calheiros e Eduardo Cunha são fracos. Se fosse com o Ulysses Guimarães, Dilma estaria dançando miudinho.
O sr. já afirmou que as esquerdas nunca conseguiram ter um projeto para o país. Por quê?
As esquerdas são muito brasileiras: tendem mais à conciliação do que ao conflito. É da formação da sociedade e do Estado. Também são muito conservadoras. Na redemocratização, em 1945, o projeto do PCB para o petróleo era privatista. Esquerda e nacionalismo convergiram numa certa fase.
A atual esquerda não tem projeto. Lula nunca teve, Dilma também não tem. O PT não sabe o que é o Brasil, não tem projeto. Está superado. Não vai acabar, mas não tem nada a dizer a respeito do desenvolvimento do Brasil. Vai empurrando com a barriga.
Seu diagnóstico de esgotamento significa previsão de derrota do PT em 2018?
É possível, mas não é provável. Quando o jogo for pesado, Lula vai ter que se realinhar. De forma até radical, o que não é do estilo dele. Ou volta a fazer política de forma mais contundente e consistente ou se prepara para entregar o queijo para os tucanos.
Lula vai ter que ser mais partidário e retomar a militância política. Vai precisar dar apoio a Dilma para que o mandato não tenha um desenlace que caia em cima dele. Se houver um desastre e o PT for desalojado do poder, as burguesias nunca mais se esquecerão disso. Vão tentar manter o PT afastado.
Como o sr. enxerga o Brasil a longo prazo?
Vai caminhar para ser uma sociedade mais igualitária. Não é otimismo. Em geral, a obrigação do cientista social é ser pessimista. Nenhuma sociedade aguenta o nível de desigualdade que se produziu.
Como avaliar politicamente essa fração da população que ascendeu nos últimos anos?
Ninguém sabe. É como olhar dentro de uma chaleira. Há vários pontos de ebulição. Mas o Brasil vai melhorando, incluindo mais gente. É a forma do capitalismo se renovar.
Ninguém pense em reformas profundas. As reformas são dadas pelo crescimento econômico e da população. Pela alfabetização. Essas são as reformas que movem a sociedade. O Brasil vai engatar, vai crescer. É impossível conter 200 milhões de pessoas, cada uma querendo o melhor para si. Esse egoísmo capitalista é positivo. O socialismo é algo para além.
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