Empreiteiras buscaram apoio, indica telegrama
Administrador no Panamá disse que pressões não influenciariam decisões
Itamaraty diz que apoia todas as empresas brasileiras e que considera normal resposta de estrangeiro
As empreiteiras Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, reunidas em consórcio para disputar uma obra no canal do Panamá, ouviram do responsável pela construção em 2007, "em tom quase rude", que "pressões de governos estrangeiros não teriam qualquer influência" na decisão sobre o contrato.
O comentário foi feito pelo administrador do canal, Alberto Zubieta, na presença do encarregado de negócios do Brasil no Panamá, Antônio Luís Espínola, que acompanhou o encontro "a pedido" das empreiteiras, que hoje são investigadas pela Operação Lava Jato.
O relato está em um telegrama reservado enviado ao Itamaraty quatro dias após a reunião e obtido pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação.
"Ao final do encontro, Zubieta tornou a frisar a preocupação com a transparência do processo e com a qualificação objetiva das empresas", relatou Espínola.
"Em tom franco, quase rude, declarou que 'pressões de governos estrangeiros e gestões de embaixadas não teriam qualquer influência sobre ele'", contou o diplomata.
A ampliação do canal, aberto em 1914, foi necessária para aumentar o tráfego de mercadorias que cruzam o Atlântico e o Pacífico. A expectativa é que a obra aumente em três vezes o fluxo de navios, o que pode representar, num prazo de até 15 anos, 10% do comércio mundial.
Iniciada em 2007, a ampliação deve ser concluída no primeiro semestre de 2016.
No encontro em janeiro de 2007, o diplomata brasileiro conta ter destacado "a alta capacitação tecnológica das empresas de construção brasileiras, sua competitividade e profissionalismo".
"Aludi à intenção do governo Lula de, em consonância com sua política de priorizar a cooperação Sul-Sul, incrementar as relações em todos os níveis com o Panamá", afirmou, no documento.
Meses depois, em agosto de 2007, o então presidente Lula visitou o país, em um giro pela América Central e Caribe, e também mencionou o interesse de empresas brasileiras na disputa.
No encontro com o então administrador do canal do Panamá, o diplomata brasileiro afirmou que o governo "estava disposto a colaborar no que fosse possível para viabilizar essa participação".
Reunidas em consórcio, as brasileiras foram classificadas para a disputa, mas perderam a licitação para o grupo liderado pela espanhola Sacyr.
APOIO A EMPRESAS
Procurado, o Ministério das Relações Exteriores disse que dá apoio a todas as empresas brasileiras que o solicitam e que considera "normal" a resposta do administrador do canal do Panamá, como uma atitude em defesa do interesse público do país.
A Andrade Gutierrez informou que "desconhece o conteúdo de tais telegramas e não fará comentários sobre documentos sobre os quais não têm conhecimento".
Disse ainda que jamais recorreu ao governo para viabilizar projetos no exterior. "A atuação da companhia em países estrangeiros se deve, única e exclusivamente, à sua capacidade de realização."
A Queiroz Galvão afirmou que "jamais dependeu de qualquer intervenção do governo brasileiro para conquista de contratos no exterior" e que "é reconhecida internacionalmente pela sua expertise técnica e por seu quadro de funcionários altamente qualificados".
A Camargo Corrêa disse que o teor do telegrama "não indica qualquer fato extraordinário à atuação regular" de postos brasileiros no exterior.