Dilma diz que país vive um clima de 'golpe democrático à paraguaia'
Presidente foi irônica ao se referir à queda de Fernando Lugo, contestada à época pelo Brasil
Na primeira reunião com novos ministros e após derrotas no Congresso, petista cobra fidelidade de aliados
Diante de movimentos cada vez mais fortes pela abertura de um processo de impeachment contra seu mandato, a presidente Dilma Rousseff disse nesta quinta (8) que está em curso no país um "golpe democrático à paraguaia". Dilma, porém, fez questão de frisar que o Brasil não é o Paraguai, visto que tem "instituições fortes".
O comentário foi feito no encerramento da primeira reunião ministerial de sua nova equipe. Num gesto com os dedos, ela indicou que a expressão "golpe democrático", deveria ser entendida entre aspas, como uma ironia.
O encontro com os ministros, fechado à imprensa, foi realizado em uma semana em que o governo Dilma sofreu duas derrotas em tribunais que podem colocar em risco a continuidade de seu segundo mandato. O TCU (Tribunal de Contas da União) rejeitou as contas da presidente em 2014 e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) abriu investigação sobre supostas irregularidades na campanha à reeleição.
Segundo relato feito à Folha por três ministros, ao finalizar a reunião, a presidente procurou demonstrar que não se abateu com as últimas derrotas. Neste momento ela mencionou o "golpe democrático à paraguaia".
Em 2012, o então presidente paraguaio, Fernando Lugo, sofreu processo de impeachment por "mau desempenho de suas funções" e foi substituído pelo vice Federico Franco, que estava rompido com ele. Na época, países da América do Sul disseram que houve uma "ruptura da ordem democrática no Paraguai" e decidiram suspender o país temporariamente do Mercosul e da Unasul (União das Nações Sul-americanas). A proposta da suspensão partiu, inclusive, de Dilma.
Durante a reunião, a presidente cobrou fidelidade dos partidos aliados e disse que, com a reforma ministerial anunciada na semana passada, agora precisa de "colaboração". Dilma quer votos suficientes para reverter no Congresso a reprovação das contas pelo TCU e pediu especialmente aos ministros do PMDB que façam reuniões semanais para acompanhar os parlamentares do partido.
Setores do PMDB já fizeram chegar ao vice-presidente Michel Temer que não se sentem contemplados na nova Esplanada, negociada pelo Planalto com o líder da legenda na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), que indicou dois novos ministros, o da Saúde e o da Ciência e Tecnologia.
Escalado para falar com a imprensa depois do encontro, o novo ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, disse que o governo acompanhará com atenção os movimentos da oposição em relação a um eventual processo de impeachment e ressaltou que ele não pode ser tratado como "instrumento de disputa política". "Querem dar consistência artificial a um processo como esse", afirmou.
Wagner disse ainda que a presidente entende que a resposta do governo à reprovação das contas pelo TCU deve ser feita na CMO (Comissão Mista de Orçamento) no Congresso, a quem caberá produzir um parecer sobre o tema.
Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) reclamou que acordos feitos para atender aliados, como nomeação para cargos e liberação de emendas parlamentares, precisam ser cumpridos. Segundo ele, a demora nesse processo contribuiu para as derrotas do governo na Câmara na semana.
O vice-presidente Michel Temer disse que apoiava as reclamações de Berzoini, lembrando que, durante o período em que esteve na articulação política, sofreu com o mesmo problema. Um dos motivos para que Temer se afastasse do posto de articulador político foi o que seu grupo classificou como "boicote" de petistas, que não cumpriam acordos feitos por ele.
Na reunião, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, sugeriu que cada ministro tenha uma cartilha de perguntas e respostas para fazer a defesa do Planalto em relação às pedaladas fiscais.
Armando Monteiro (Desenvolvimento e Comércio Exterior) discordou de alguns pontos apresentados por Adams, o que gerou uma pequena discussão. (VALDO CRUZ, GUSTAVO URIBE, MARINA DIAS E ISABEL VERSIANI)