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Eleições 2012

Entrevista / Fernando Haddad

Gestões do PT sofreram preconceito em São Paulo

PETISTA DIZ QUE MARTA E ERUNDINA FORAM INJUSTIÇADAS, ATACA SERRA E PROMETE TRAZER MAIS VERBAS FEDERAIS PARA A CIDADE

Marisa Cauduro/Folhapress
Fernando Haddad em entrevista na sede municipal do PT, no centro
Fernando Haddad em entrevista na sede municipal do PT, no centro

BERNARDO MELLO FRANCO
DE SÃO PAULO

Escolhido pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para tentar levar o PT de volta à Prefeitura de São Paulo, Fernando Haddad diz que o partido foi vítima de preconceito nas duas vezes em que governou a cidade, com Luiza Erundina (1989-1992) e Marta Suplicy (2001-2004).

O petista acusa o rival José Serra (PSDB), que lidera a disputa, de não ter interesse pelos problemas da cidade.

Ele desconversou sobre a foto com Paulo Maluf (PP), que fez Erundina abandonar sua chapa, e evitou citar o nome do ex-prefeito em mais de uma hora de entrevista.

Aos 49 anos, casado e pai de dois filhos, Haddad será lançado hoje por seu partido em convenção na Câmara Municipal. Estreante em eleições, ele diz que ainda estranha a exposição pública e a maratona de candidato. "Estou me acostumando. No começo, foi pior", conta.

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Folha - Faltam pouco mais de três meses para a eleição e o sr. ainda tem 6% de intenções de voto, segundo o Datafolha. Como avalia suas chances?
Fernando Haddad - Temos um bom tempo de TV e vamos apresentar a melhor proposta. Já estou em terceiro lugar. Não vejo chance de não chegar ao segundo turno contra um candidato [José Serra, do PSDB] que está estagnado há meses, já sendo conhecido por 100% do eleitorado.

O sr. diz que Marta e Erundina foram as melhores prefeitas da cidade. Nos dois casos, o PT foi derrotado na eleição seguinte. Como explicar isso?
São Paulo não é conservadora, mas há forças políticas muito conservadoras na cidade. Houve preconceito em relação às nossas duas administrações. Colocaram questões de ordem pessoal acima das políticas públicas.
O governo Marta terminou bem avaliado. Era natural que ela fosse reeleita, mas prevaleceram outros aspectos. Houve uma indisposição com a maneira com sua personalidade. Com ela e Erundina, as pessoas se apegaram mais à forma que ao conteúdo.

A eleição será nacionalizada por PT e PSDB, como diz Lula?
Se a crise mundial se tornar mais aguda, um dos elementos centrais para enfrentá-la será o investimento público. Hoje, se a prefeitura for chamada, não terá projetos a apresentar ao governo federal. O alinhamento da cidade com o país é essencial.

Se for eleito, os repasses federais para SP vão aumentar?
Com certeza. A cidade abdicou da parceria federativa na melhor década dos últimos 30 anos. Houve uma deliberação do prefeito de não fazer parcerias.

A promessa de receber mais verba por ser do PT não sugere uma quebra de isonomia?
No MEC, atendi 100% da demanda, sem discriminar o partido político do prefeito ou do governador. Nenhum projeto foi recusado por questão partidária.

É possível empunhar a bandeira da ética aliado ao ex-prefeito Paulo Maluf?
Fizemos um alinhamento com os partidos da base do governo Dilma. O PP tem a quarta bancada na Câmara [hoje a quinta, com a criação do PSD]. Não estamos falando de um partido residual. Se todo mundo agir assim [com veto a alianças], você nunca vai reunir agremiações.
Eu me comprometi em criar uma Controladoria-Geral do Município. Passei seis anos e meio no MEC. A imprensa revirou o ministério de ponta-cabeça. Eu e meus auxiliares tivemos conduta exemplar no uso do recurso público. Vou manter a minha conduta. Meus adversários nunca ousaram me questionar sob este ponto de vista.

Ao ser questionado sobre esta aliança, o sr. nunca cita o nome de Maluf? Por quê?
Há uma tentativa de fulanizar o debate que eu nunca vi no governo federal. Você dificilmente vai colher uma frase minha no MEC em que eu me refiro a uma pessoa.

Ao criticar a prefeitura, o sr. cita os nomes de Serra e do prefeito Gilberto Kassab.
Aí estou falando do chefe do Executivo atual. Na ocasião [em que Maluf foi prefeito], fiz as críticas devidas à gestão dele e trabalhei muito para que o PT ganhasse as eleições. Não abdico das minhas opiniões sobre as administrações passadas.

Sua aliança com Maluf, selada na casa dele, foi rejeitada por 64% dos eleitores que votam no PT. Como vê esta reação?
A pergunta induz a resposta. Se o Datafolha perguntar se o eleitor aprova o governador Geraldo Alckmin receber com frequência no palácio o mesmo personagem [Maluf], o resultado não será muito diferente.

Lula exagerou na deferência a um político que está na lista de procurados da Interpol?
Hoje o [Fernando] Collor reconhece que o Lula foi o maior presidente do país. O [José] Sarney também.

E não é Lula quem está resgatando as biografias deles?
Eu não vejo assim. Ele está recebendo o reconhecimento de que é o maior líder que este país já teve. E há estruturas partidárias se realinhando em torno de um projeto nacional que está dando certo.

Que sequelas a saída de Erundina deixará na campanha?
Quando a campanha começar, as coisas vão tomar a proporção que elas têm. Ela vai participar da campanha.

E Marta?
Tenho a expectativa de que ela venha ao nosso encontro, até por suas declarações.

Houve algum diálogo depois que ela faltou ao lançamento de sua candidatura, dia 2?
Não.

O sr. faz discurso de oposição, mas quase se aliou a Kassab. Sentiu-se aliviado quando ele declarou apoio a Serra?
O acordo nunca esteve para ser fechado realmente. A reação no PT foi muito forte, e eu não via isso como uma possibilidade concreta.
Sempre deixei claro que não abdicaria do discurso de mudança. Acreditava que Serra seria candidato. Neste curto século 21, houve seis eleições. Ele vai participar da quinta. O prefeito sempre disse que o apoiaria, até por se tratar de criador e criatura.

Serra lidera a disputa e teve mais votos que Dilma na cidade em 2010. Como vencê-lo?
O PSDB detém o poder no Estado há 18 anos. É natural que ele tenha esta força. Ao mesmo tempo, há uma percepção de fadiga de material.

Lula é mais contundente ao criticá-lo. Houve uma divisão de papéis para que o sr. adote uma linha "paz e amor"?
Nossas declarações têm sido muito espontâneas. Não há nada combinado entre nós. Tenho falado livremente sobre a gestão Serra-Kassab.

Serra se elegeu prefeito em 2004 e descumpriu a promessa de cumprir todo o mandato. Como vai explorar isso?
Serra tem revelado que coloca os interesses pessoais acima dos interesses da cidade. Você não consegue realizar uma obra importante se não tiver compromisso com a permanência no cargo.
Ele se elegeu a partir do que dizia ter acumulado no Ministério da Saúde. Passados oito anos, esta é a área mais crítica da cidade, segundo a população. Outro dia, ele disse que ônibus congestiona o trânsito [risos]. Isso é lapidar. O Serra não conhece os problemas metropolitanos. Não se dedicou a eles.

Acredita que ele, se eleito, renunciará de novo para disputar a Presidência em 2014?
Não sei. Quando a credibilidade de uma pessoa é colocada em jogo por ela mesma, é difícil prever seu comportamento. O que não vejo é o Serra falar de São Paulo. Nos artigos que escreve, ele mais ataca o governo federal do que defende a gestão municipal da qual participou.

O sr. será atacado por sua participação na criação das taxas do lixo e da luz no governo Marta. Como vai se defender?
O Serra não acabou com nenhuma taxa. Ele substituiu a do lixo pela do carro [de inspeção veicular]. A da luz, ele não eliminou. Era uma crítica falaciosa. São Paulo tinha R$ 10 bilhões de arrecadação. Hoje tem R$ 33 bilhões. Não havia dinheiro para a semana quando a Marta assumiu.

O sr. disse que quer fazer um governo de esquerda. Como levar as ideias para a prática?
A classe média, com razão, é preocupada com a temática ambiental. Eu acho que ela só vai se realizar associada a um plano habitacional para a população de baixa renda. Isso ninguém diz. Só alguém que tem perspectiva de classe e compromisso com os mais pobres é capaz de enxergar.

O STF julgará o mensalão na reta final da campanha. A eventual condenação de petistas pode prejudicá-lo?
É um assunto muito distante da minha biografia. Torci para que o julgamento acontecesse antes. Agora é cada um respondendo pela sua biografia. Penso que há muitas fragilidades no processo, mas não sou a pessoa mais adequada para julgar.

O ex-ministro José Dirceu, chamado de "chefe da quadrilha" na denúncia, foi ao lançamento de sua pré-candidatura. Como será a participação dele na campanha?
Ele tem procurado não participar das campanhas porque precisa equacionar essa pendência [o julgamento no STF] para eventualmente retornar à vida pública. Eu tomaria a mesma decisão.

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