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FOCO
Intelectual e marqueteiro de Dilma afirma que Serra deveria usar FHC
Conceituador da equipe do PT, antropólogo Antonio Risério defende marketing político
FABIO VICTOR
DE SÃO PAULO
Será possível que numa
entrevista sobre marketing
político de repente surjam
Merleau-Ponty, Maiakóvski,
John Cage, Smetak, nouvelle
vague e pop art? Perfeitamente possível, se o entrevistado for Antonio Risério.
Antropólogo, historiador,
poeta e compositor baiano,
amigo de Caetano e de Gil,
frequenta também este mundo tão distante das artes e do
debate intelectual que é o da
propaganda política.
É sua terceira campanha
presidencial seguida pelo
PT, como conceituador e redator. Ao lado do amigo João
Santana, chefe da equipe de
comunicação de Dilma Rousseff, traduz a estratégia política para a linguagem direta e
ligeira do marketing.
Também traça diretrizes
para municiar a candidata
em debates e entrevistas. E
vigia a propaganda dos tucanos, apresentando sínteses
críticas. "Serra é um blefe,
como ele mesmo não cansa
de demonstrar. Ele não resiste a uma hora de confronto
com Dilma", diz, por e-mail.
RECADO DA CAMPANHA
Ele sublinha que não fala
em nome da campanha. Mas,
dada a mudez de Santana
-cuja discrição é parte sagrada de uma persona- e o
papel-chave de Risério na
equipe, não é demais supor
que o antropólogo exprima o
pensamento corrente na comunicação dilmista.
"Serra começou se posicionando bem, no início do
ano. Como Lula botou a carta
plebiscitária na mesa, ele
ampliou o arco temporal, visando à diluição dos contrastes. Celebrou um novo Brasil,
que viria de Tancredo a Lula,
com os avanços se desdobrando uns dos outros."
"Não entendo por que ele
arquivou esse discurso, que
nos levaria a um belo embate
político. Se eu trabalhasse na
campanha dele, diria: vamos
entrar no horário eleitoral
com um puta programa sobre Fernando Henrique,
mostrando a conquista da estabilidade. Mas Serra preferiu ser o candidato dos genéricos e das denúncias."
Entre marqueteiros e políticos, Risério é apontado como "o pensador" de uma
campanha. Alguém que, na
definição de um publicitário
veterano em disputas eleitorais, "pode passar uma semana sem escrever, mas na
hora certa faz a diferença".
A roupa não lhe cai bem.
"É evidente que não sou o
único a pensar. Em primeiro
lugar, porque João Santana é
também um intelectual, com
quem você pode conversar
sobre coisas tão variadas
quanto a "kali yuga" e a música de John Cage."
Rejeita o selo de "conceituador verbal" e acrescenta
que, se houver um na campanha, é Santana.
A deferência é reflexo de
uma amizade de mais de 40
anos. Risério e Santana estudaram jornalismo juntos,
criaram uma Associação dos
Amigos de Smetak (homenagem ao músico suíço-baiano), trabalharam na Prefeitura de Salvador, embarcaram
com Duda Mendonça no
marketing político.
Autor de mais de uma dezena de obras, Risério dedicou a Santana "A Utopia Brasileira e os Movimentos Negros" (ed. 34/2007), reunião
de ensaios sobre mestiçagem
e racismo no Brasil.
"A melhor análise político--sociológica brasileira, nos
últimos anos, vem dele. Desde a leitura da conjuntura de
2002, quando disse que o embate se daria entre a esperança e o medo. E que a esperança venceria", diz, minimizando o papel de Duda, que fez
então o marketing de Lula.
Santana deixou a parceria
com Duda um pouco antes
da disputa de 2002. Risério ficou -é um dos três remanescentes da primeira eleição de
Lula no "núcleo duro" da
atual campanha, ao lado da
diretora Lô Politi e do diretor
de arte Marcelo Kertész-,
mas não esconde com qual
marqueteiro se afina melhor.
"João tem densidade política, estética e intelectual. A
diferença está toda aí. Duda é
um brutalista, que pode surpreender pela intuição."
O credo no alcance da propaganda que faz com Santana induz Risério a discordar
da ideia de que o marketing
despolitiza a política.
"Acho que o marketing
contribuiu, e muito, para a
politização da sociedade brasileira. Penso com Maiakóvski: publicidade é agitação de
massas. Agora, a politização
mais densa cabe aos partidos. E eles não parecem muito interessados no assunto."
Mas então por que a propaganda não aprofunda as
propostas dos candidatos?
"Não dá para aprofundar
uma tese filosófica num filme. Merleau-Ponty não cabe
na nouvelle vague. E um filme tem uma duração seis ou
nove vezes maior que a de
um programa político, em
que você dispara mensagens
claras e sintéticas", defende.
CORAÇÃO E ALMA
Instado a falar sobre o desafio de "vender" uma candidata sem carisma após duas
campanhas escrevendo para
um comunicador carismático como Lula, Risério elogia
ambos, com um reparo.
"É claro que Dilma não é
Lula. Mas ninguém hoje, no
Brasil, é Lula. Só não topo
quando ele fala em "extirpar"
o DEM. Mas entendo. Ele está
no embate". Foi essa a frase
que fez o amigo Caetano chamar Lula de "golpista".
"No fundo, Caetano está
mais próximo de Lula do que
admite publicamente. Talvez
até do que admita para si
mesmo. Sinto que o coração
dele, às vezes, bate com algum temor. Mas sei de que lado a alma dele está."
FOLHA.com
Leia íntegra da entrevista
folha.com/po806691
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